sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Brasil, um país sem futuro

Que o Brasil está numa crise profunda, que já dura anos, não é surpresa para ninguém. O que é chocante, quando se para para pensar, é a completa falta de projetos em curso que nos levem a uma realidade melhor, no futuro.

Há alguns caminhos bem conhecidos para a prosperidade. Um deles é a educação. Praticamente todos os países que saíram da pobreza para se tornarem ricos antecederam esse salto com um projeto consistente de universalizar e aumentar a qualidade da educação. Afinal, nada tem tanto valor para a economia quanto uma população com alta capacidade - está aí a base sobre a qual se assenta um país capaz de mudar sua realidade. É o chamado capital humano, maior fonte de riqueza de vários países pobres em outros tipos de recursos naturais, como a Dinamarca, a Coreia do Sul, a Finlândia, a Irlanda e mesmo a China.

Nada do gênero está sendo feito aqui agora. Muito pelo contrário, aliás. O orçamento da educação no país vem sendo massacrado ano a ano. É da educação que o governo queria tirar dinheiro para bancar seu programa Renda Cidadã, a nova versão do Bolsa Família - o plano acabou barrado. Mesmo assim, o Ministério da Educação já fala em cortes bilionários para o ano que vem - isso por cima dos seguidos cortes que tiraram do Brasil mais de metade dos investimentos em infraestrutura para educação nos últimos cinco anos.



Outro caminho, intimamente conectado ao primeiro, é a ciência e a tecnologia. Países com universidades e laboratórios excelentes e um setor produtivo inovador não precisam se conformar com a realidade do mercado: eles podem inventar mercados novos. Mas os investimentos em ciência no Brasil vêm sendo massacrados há anos - a ciência brasileira precisou enfrentar 2020 sob cortes de mais de 80% no fomento à pesquisa. Quase todos os melhores cientistas do Brasil estão indo-se embora, planejando fazê-lo ou sofrendo para sobreviver. Universidades viraram palcos da guerra ideológica, com reitores impostos pelo presidente e sem dinheiro até para o papel higiênico.

Prosperidade no futuro também está intimamente ligada a erguer infraestrutura no presente. Isso ganha importância nestes tempos em que vivemos, porque o mundo inteiro está aproveitando esta crise para construir uma infraestrutura diferente, pensada para um mundo pós-carbono: veículos elétricos, trens de alta velocidade, usinas de energia renovável, coisas pensadas para durar décadas, numa nova realidade climática.

Mas, no Brasil, o orçamento em infraestrutura também vem caindo aceleradamente - em 2020 foi o menor em 16 anos. Não só está caindo, mas o pouco que sobra é completamente obsoleto. O governo vem por exemplo asfaltando estradas do tempo da ditadura no meio da Amazônia - em vez de reduzir a dependência nacional no rodoviarismo e nos combustíveis fósseis.

Se não bastasse o Brasil não semear a prosperidade do futuro, o país vem pondo em risco inclusive a economia do presente. Hoje o Brasil é muito dependente de produtos primários, principalmente commodities agropecuárias como a soja. É pouco para um país que quer ser rico: depender de matérias primas sem valor agregado e importar tudo de industrializado é o caminho para ficar no vermelho. Mas mesmo esse pouco está sob ameaça.

Afinal, a grande riqueza do Brasil, que permite que o país seja uma potência agropecuária, é a riqueza em recursos naturais. E o país está colocando tudo isso a perder, deixando impunes o 1% de produtores agrícolas que desmatam ilegalmente, deixando os incêndios tomarem todos os ecossistemas e queimando junto a marca Brasil diante de seus clientes, ao associá-la à destruição ambiental.

O Brasil está se metendo num beco sem saída: abrindo mão de qualquer chance de prosperidade no futuro. O único lado positivo que consigo ver nisso, depois de muito esforço, é que a falta de saída adiante talvez ajude a criar o consenso necessário para nos forçar a mudar de caminho. Mas precisa ser rápido. Do jeito que está, este é um país sem futuro.

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