domingo, 19 de julho de 2020

O inverno do capitão

O governo Bolsonaro fracassou. Um ano e meio depois, o Ministério da Educação recomeça pela terceira vez e agora fala em Estado laico, a Saúde está cercada de mortos de uma pandemia que não sabe enfrentar, na política externa o Brasil virou um país pária, a agricultura paga a conta dos crimes no meio ambiente. A ideia de governar com truques na mídia social terminou em páginas desativadas e uma investigação no Supremo. A economia não entregou o que prometeu e vive agora das promessas do ministro que declama as mesmas histórias sem relação com os fatos e números. E os militares? Ah, os militares são um caso à parte.

Oficiais generais se deixaram usar por um ex-militar, que nunca se destacou nas tropas, enfrentou a justiça militar por mau comportamento e teve uma carreira medíocre como deputado. Hoje estão no pior dos mundos: as tropas executam com denodo as missões recebidas, mas os comandos as colocaram como sócias de um desastre. As Forças Armadas jamais poderiam ter se misturado a um governo que fomenta o ódio e a divisão do país. Elas pertencem ao Estado, têm compromisso com a união, e recuperavam o prestígio perdido na ditadura. Hoje voltam a sofrer desgaste e deveriam ouvir as palavras fortes do ministro Gilmar Mendes como conselho para que batam em retirada.


Bolsonaro vendeu ilusões na campanha. Acreditou quem escolheu a cegueira deliberada. Falou em combater a corrupção, mas sabia o que acontecia em seu gabinete e no de seus filhos. Sendo falsa a promessa, o que restaria a Bolsonaro fazer? O que tem feito. Desidratou o pacote de Moro, tentou interferir na Polícia Federal, escolheu um procurador-geral com a missão de desmontar a Lava-Jato e fazer do Ministério Público um braço do executivo.

Os grotescos erros no meio ambiente levaram a economia a um enorme risco e o governo a um contorcionismo. O vice-presidente tem que consertar o que Ricardo Salles fez. Salles acabou com o Fundo Amazônia, Mourão tenta recriá-lo. Salles prestigiou madeireiros e grileiros, Mourão avisa que as tropas ficarão na Amazônia combatendo o desmatamento. Salles enfraqueceu Ibama e ICMbio, e Mourão disse que terá que fortalecer os órgãos. Salles é um papagaio, repete o que ouve sem entender o significado. Fala de bioeconomia, cujo sentido não captou.

Fala em regularização fundiária, que está paralisada. O governo Bolsonaro entregou seis títulos de terra. Em 2014, a presidente Dilma entregou nove mil. Essa comparação é o exemplo mais claro do fiasco. Em setembro de 2019, o governo fez uma reunião com garimpeiros no Planalto. Presentes, Salles, Onyx e Heleno. A “Época”, pela Lei de Acesso à Informação, soube quem estava presente. Havia entre os garimpeiros alguns réus. Um deles por usar cianeto, produto altamento tóxico, e por receptação de ouro ilegal, outro por invasão na Terra Ianomami. Mourão, agora, diz que é difícil tirar os garimpeiros do território dos Ianomami.

O projeto na educação era brigar com o fantasma de Paulo Freire e outras alucinações. Paralisou o Ministério. O ministro Milton Ribeiro chegou prometendo respeitar o Estado laico. Se o fizer, estará seguindo a Constituição. Mas pode desagradar as tais alas do presidente.

Se Eduardo Pazuello sair do Ministério da Saúde trará alívio ao Exército. Mas esse é apenas o problema formal. Na saúde os brasileiros sofrem o resultado do mais trágico fracasso de Bolsonaro. Ele segue agarrado à sua cloroquina, enquanto o país chega a dois milhões de infectados e mais de 77 mil mortos. Não há uma política federal de saúde. Bolsonaro é o comandante da desinformação no meio da pandemia, e o general, seu fiel soldado.

A economia não entregou a agenda liberal que Paulo Guedes ofereceu para preencher o programa vazio de Bolsonaro. A pandemia nos levou à pior recessão da história, e o ministro segue repetindo o discurso que decorou.

Sim, o governo fracassou até aqui. Em algumas áreas tenta recuar, em outras persiste no erro. Nesse inverno das nossas dores, o presidente passeia entre emas pensando em como sobreviver nos próximos dois anos e ser reeleito. Mas para que ele quer governar? Para favorecer seu clã, para espalhar armas, para demolir instituições, para agredir a imprensa que não o bajula, para resolver o recalque de uma pífia carreira militar mandando em generais.

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