Independente do juízo maior que se possa fazer sobre o governo de Boris Johnson, foi uma fala digna de um líder nacional.
Elas também não indicam o rumo que o governo tomará. Até o momento em que escrevo esta coluna, Luiz Henrique Mandetta continua ministro da Saúde, mesmo depois de dar uma entrevista ao Fantástico em que disse com todas as letras que ele e o presidente divergem na estratégia. Que ele continue ministro só demonstra o quão frouxo é Bolsonaro no campo da ação.
Fala que o isolamento social é desastroso para o Brasil e mesmo assim não troca o ministro que promove o isolamento. Bolsonaro torna-se cúmplice daquilo que suas palavras condenam. Ladra, mas não morde.
Tampouco esperamos a verdade das palavras dele. Quando Bolsonaro disse em 9 de março que tinha “provas” de que as eleições de 2018 foram fraudadas, ninguém acreditou —nem mesmo seus apoiadores e fãs. Era óbvio que ele não tinha prova nenhuma; era só mais um blefe, mais uma mentira contada para chacoalhar as águas do debate público e ser esquecida no dia seguinte, quando novas provocações aparecessem.
Assim como a emissão descontrolada de moeda corrói seu valor, o palavrório inconsequente de Bolsonaro deprecia a palavra presidencial. Durante uma hiperinflação, as pessoas param de aceitar pagamentos em dinheiro. É hora de tratar as palavras do presidente da mesma maneira: como elas de nada valem, também não devem ser levadas a sério ou receber o destaque da imprensa.
Como todo mundo que passou pelos anos de colégio deve ter aprendido, uma provocação só tem poder na medida em que damos importância a ela. Bolsonaro ir a pé à farmácia ou à padaria nada mais é do que uma provocação barata de um presidente que carece da coragem para fazer valer suas palavras na condução do governo.
Essa e outras pirraças presidenciais (e dos filhos) são objetivamente irrelevantes para o país, e só adquirem centralidade na medida em que reagimos a elas.
Tornar as suas gracinhas o centro diário do debate público é conceder-lhe uma importância que não tem. O presidente não manda mais no país. Comporta-se como uma criança birrenta que tenta atrapalhar o trabalho dos adultos.
Na medida em que seu choro desvia nossa atenção, ele é bem sucedido. Está desacreditado, mente sem parar, e busca gerar barulho para que não nos demos conta do óbvio: na maior crise de seu governo (a primeira não causada por ele), Bolsonaro é irrelevante. Tratemo-lo como tal. Neste momento, não merece mais do que a notinha no pé da página.Joel Pinheiro da Fonseca
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