De acordo com os dados coletados pela InLoco com base na localização de celulares, o índice de isolamento social no país caiu de 69,6%, no último dia 22, para 49%, ontem. No estado de São Paulo, ficou pouco abaixo disso, 48,7%. Em bairros críticos da cidade, como o centro, mal passa dos 30%, como se não tivesse havido nenhuma mudança.
Tal quadro representa a receita certeira para a explosão nos casos. Enquanto muitos continuam nas ruas, enchem as praças e transformaram os supermercados em shopping centers, o novo coronavírus encontra mais gente para infectar e se espalhar. São Paulo se torna aos poucos uma espécie de Wuhan, epicentro da epidemia na China, onde a população teve de ser submetida a medidas draconianas de isolamento para diminuir a transmissão da Covid-19.
Fossas comuns para indigentes mortos de Covid-19, no Bronx, bairro de Nova York |
Em cidades chinesas onde o contágio foi detido, os contatos caíram pelo menos 85%. No Reino Unido, um estudo recente estimou em mais de 70% a diminuição na quantidade de interações entre os habitantes (note que há uma diferença entre esse número e os usados por Doria ou pela InLoco, medidas da proporção da população parada em casa – embora ambos estejam relacionados).
A resistência do brasileiro em aceitar a necessidade de isolamento tem fundo cultural. Há um misto de ignorância e onipotência. A primeira despreza os mecanismos de contágio e a facilidade de contrair um vírus que fica incubado até uma semana e é transmitido por quem nem apresenta sintomas. A segunda acredita que “nada de grave vai acontecer comigo” ou “é só uma gripezinha”.
Ambas são características presentes no discurso e nos atos do presidente Jair Bolsonaro, criticado ontem mais uma vez ao distribuir cumprimentos numa padaria de Brasília. A imprensa mundial tem tratado o presidente brasileiro como lunático por desdenhar a pandemia, hoje levada a sério por todos os líderes que no início hesitaram, como o americano Donald Trump e o britânico Boris Johnson, também vítima do coronavírus e só ontem liberado da UTI.
Os números da InLoco revelam que a manifestação de Bolsonaro coincide com o relaxamento no isolamento. Depois de seu pronunciamento no dia 31 de março, o índice caiu ao nível mais baixo atingido desde o início das quarentenas: 47,2%. Não há como atribuir a Bolsonaro a responsabilidade pelo que faz a população, mas é fato que sua atitude negacionista em nada ajuda o país na emergência.
Metade da população ainda tem consciência da necessidade de ficar em casa. A outra metade ou bem não pode, ou não quer. O desafio de estender o isolamento a favelas, periferias e regiões pobres ds grandes cidades depende não só da adoção de regras duras como quer Doria, mas também de um discurso coerente das autoridades em todos os níveis de governo. Quando cada um diz uma coisa, o cidadão fica perdido, faz o que bem entender ou o que lhe deixa mais confortável.
Uma realidade perversa pode dar a ilusão de que o quadro não está tão ruim quanto se pinta e incentivar o relaxamento: a epidemia evolui com atraso de duas semanas em relação às medidas das autoridades. Quem morrerá nos próximos 14 dias provavelmente já contraiu a doença e deve até estar no hospital. Para quem pega o vírus hoje, o período do contágio à morte se estende na média por mais de 30 dias.
Em virtude disso, o relaxamento dos últimos dias no isolamento social só será sentido nos números da epidemia, com a explosão inevitável nos casos, dentro de uns dez dias. O vírus, enquanto isso, continuará a se espalhar. Mantido o ritmo atual de contágio, ao fim desse período o país somaria perto de 5 mil mortos, e São Paulo, mais de 2 mil (contando apenas casos oficiais, já que não se sabe quantas mortes por Covid-19 foram atribuídas a outras causas).
O mais provável é que a tragédia já incubada seja ainda maior graças ao relaxamento no isolamento. Se não houver mudança na atitude do brasileiro – e rápido –, será impossível evitar o pior. Não vacile: fique em casa, fique em casa!
A resistência do brasileiro em aceitar a necessidade de isolamento tem fundo cultural. Há um misto de ignorância e onipotência. A primeira despreza os mecanismos de contágio e a facilidade de contrair um vírus que fica incubado até uma semana e é transmitido por quem nem apresenta sintomas. A segunda acredita que “nada de grave vai acontecer comigo” ou “é só uma gripezinha”.
Ambas são características presentes no discurso e nos atos do presidente Jair Bolsonaro, criticado ontem mais uma vez ao distribuir cumprimentos numa padaria de Brasília. A imprensa mundial tem tratado o presidente brasileiro como lunático por desdenhar a pandemia, hoje levada a sério por todos os líderes que no início hesitaram, como o americano Donald Trump e o britânico Boris Johnson, também vítima do coronavírus e só ontem liberado da UTI.
Os números da InLoco revelam que a manifestação de Bolsonaro coincide com o relaxamento no isolamento. Depois de seu pronunciamento no dia 31 de março, o índice caiu ao nível mais baixo atingido desde o início das quarentenas: 47,2%. Não há como atribuir a Bolsonaro a responsabilidade pelo que faz a população, mas é fato que sua atitude negacionista em nada ajuda o país na emergência.
Metade da população ainda tem consciência da necessidade de ficar em casa. A outra metade ou bem não pode, ou não quer. O desafio de estender o isolamento a favelas, periferias e regiões pobres ds grandes cidades depende não só da adoção de regras duras como quer Doria, mas também de um discurso coerente das autoridades em todos os níveis de governo. Quando cada um diz uma coisa, o cidadão fica perdido, faz o que bem entender ou o que lhe deixa mais confortável.
Uma realidade perversa pode dar a ilusão de que o quadro não está tão ruim quanto se pinta e incentivar o relaxamento: a epidemia evolui com atraso de duas semanas em relação às medidas das autoridades. Quem morrerá nos próximos 14 dias provavelmente já contraiu a doença e deve até estar no hospital. Para quem pega o vírus hoje, o período do contágio à morte se estende na média por mais de 30 dias.
Em virtude disso, o relaxamento dos últimos dias no isolamento social só será sentido nos números da epidemia, com a explosão inevitável nos casos, dentro de uns dez dias. O vírus, enquanto isso, continuará a se espalhar. Mantido o ritmo atual de contágio, ao fim desse período o país somaria perto de 5 mil mortos, e São Paulo, mais de 2 mil (contando apenas casos oficiais, já que não se sabe quantas mortes por Covid-19 foram atribuídas a outras causas).
O mais provável é que a tragédia já incubada seja ainda maior graças ao relaxamento no isolamento. Se não houver mudança na atitude do brasileiro – e rápido –, será impossível evitar o pior. Não vacile: fique em casa, fique em casa!
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