Quem tem o direito de decidir o lugar da escova de dentes na pia do banheiro? Como decidir quem deve decidir a marca da pasta de dente? Com a emancipação masculina em curso, os homens portadores da nova masculinidade (ou deveria dizer novas masculinidades, já que existe uma masculinidade para cada homem?), seguramente exigirão o direito de decidir a marca da pasta de dente.
As mulheres, por sua vez, já há décadas nessa estrada da maioridade ou emancipação, se queixarão da suposição de que escolher a marca da pasta de dente seria “função do gênero feminino” —“@s juízes” decidirão?
Na verdade, marchamos para uma situação em que pessoas exigirão o direito, enquanto cidadãos, de ter um juiz para cada uma delas. Um juiz do trabalho, cível, criminal, e por aí vai.
Claro que deverá ser um algoritmo. No futuro próximo, terão acesso a um juiz app para baixar no celular e decidir quem tem o direito de escolher o vinho no restaurante e se você tem ou não direito de comer carne numa mesa ao lado de um vegano. Cometer esse ato poderá ser considerado irresponsabilidade afetiva para com as emoções do cidadão da mesa ao lado, que se sentirá ofendido com a indiferença alimentícia praticada pelo carnívoro boçal.
Há pouco dias me contaram que numa muito importante universidade dos Estados Unidos, mandar um email num grupo de pesquisa virou um inferno. A questão é: como usar a gramática diante do fato de que você poderá ofender a um transgênero caso haja um (ou uma?) na equipe que recebe o email?
Quem ainda acha que o politicamente correto é “necessário” é porque ganha dinheiro com ele ou porque não percebeu ainda que essa prática é uma forma de censura destruidora da capacidade de pensar, agir, escrever e falar. A desarticulação que o politicamente correto causa na educação, na ciência, na publicidade, na política é indicativo de que ele se transformou num mercado em si.
Pela primeira vez na história uma forma de censura se fez mercado: o politicamente correto é uma forma de inquisição ao portador. E o linchamento constante típico das redes sociais torna o politicamente correto uma arma contra patrocinadores, profissionais do esporte, da arte (esses, normalmente, já vendidos ao politicamente correto), da mídia, da política, do Poder Judiciário, enfim, toda forma de atividade pública.
O mercado jurídico cresce para advogados que adoram esse inferninho. Se você pode ser processado por respirar para o lado errado, os advogados adoram. Já os juízes, não sei. Trabalhar como juiz numa sociedade de retardados mentais sociais não me parece a coisa mais fácil do mundo.
As pessoas se recusam ao uso da autonomia ou do senso comum e decidiram que precisam de um “juiz para chamar de seu”. Ninguém assume nada, apenas terceirizam. Já terceirizavam filhos, idosos, animais, agora vão terceirizar o ato de decidir questões cotidianas. O excesso de demandas ao judiciário é índice de retardo mental social. Os advogados ganharão mais dinheiro com esse retardo mental social.
A própria gestão da cidade cede a infantilização do convívio social. Exemplo: na região da praça Panamericana, na zona oeste da cidade de São Paulo, numa das esquinas de maior trânsito do local acima citado, uma daquelas empresas que investem no “brincar de Amsterdã” instalou suas bicicletas para riquinhos usarem, fechando uma faixa inteira da rua.
Em vez de simplesmente proibir as pessoas de pararem o caro ali, como paravam, e assim, desafogar o acesso complicado à praça Panamericana nos horários de pico, a gestão pública investiu no “brincar de Amsterdã”. Qual seria a causa de ato tão regredido em nome das modinhas de comportamento?
Uma hipótese possível é o puro e simples retardo mental social como fenômeno crescente nas sociedades ocidentais. Talvez como forma decorrente do consumismo e do individualismo. Se sou poderoso como consumidor, serei como cidadão que só quer o mundo aos seus pés. Consumir a condição infantojuvenil como parte dos direitos civis. Um parque temático de retardados descolados.
Luiz Felipe Pondé
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