No entanto, em diversos países do mundo, a classe média tem visto seu padrão de vida estagnar ou cair, enquanto grupos com rendas mais altas continuaram a acumular renda e riqueza, diz a organização.
Grande parte da classe média está financeiramente vulnerável – ou seja, se encontra incapaz de lidar com gastos inesperados ou quedas repentinas na renda – e endividada.
Nos países que fazem parte da organização, mais de um em cada cinco lares de classe média gasta mais do que ganha, o que gera um risco altíssimo de endividamento excessivo. Esse nível varia de 10% em países como a Estônia e a Polônia a mais de 50% no Chile e na Grécia. No Brasil (que aguarda resposta para seu pedido de integrar a instituição) o índice chega a 27 % dos lares de classe média.
Quase 40% dos lares de classe média em 18 países europeus da OCDE estão financeiramente vulneráveis – índice que varia de 12% na Noruega a 70% na Grécia. E metade dos lares nesses países tem dificuldade em pagar suas despesas recorrentes.
Os dados foram publicados nesta quarta em um relatório da organização sobre as dificuldades financeiras, os crescentes riscos e as pressões enfrentadas pela classe média. Chamado Under Pressure: The Squeezed Middle Class (Sob Pressão: A Classe Média Espremida, em tradução livre), o estudo analisou dados dos 36 países da instituição e de países emergentes como Brasil e África do Sul.Direito de imagemEMPICS
O relatório é o quinto de uma série de estudos sobre as tendências, causas e consequências da desigualdade no mundo.
Ele mostra que em todas as gerações desde os baby boomers (nascidos após a Segunda Guerra Mundial) a classe média diminuiu e sua influência econômica enfraqueceu. Três décadas atrás, a renda agregada dos lares de classe média era quatro vezes maior do que a renda agregada dos lares de renda alta. Hoje, essa proporção é menor do que três.
Segundo a OCDE, isso alimentou a percepção de que o atual sistema socio-econômico é injusto e que a classe média não se beneficiou do crescimento proporcionalmente à sua contribuição para ele.
A instituição sugere a criação de políticas públicas que possam reverter esse quadro e aliviar as pressões sofridas por esse grupo, que é um "motor do crescimento econômico e pilar da estabilidade social".
"Sociedades com classes médias fortes têm índices de criminalidade menores, maiores níveis de confiança e satisfação com a vida, além de maior estabilidade política e boa governança", diz Gabriela Ramos, responsável pela iniciativa de Crescimento Inclusivo da organização, na abertura do estudo.
Na maioria dos países da OCDE, o excesso de endividamento é maior na classe média do que na população em geral – e em muitos deles isso vem crescendo.
Segundo o relatório, um dos principais motivos para esse endividamento da classe média foi uma alta no custo de vida: o custo dos principais serviços e bens aumentou muito mais rápido que a renda.
A renda desse grupo demográfico cresceu mais devagar do que a renda de quem está no topo em cada uma das últimas três décadas. Nos países da OCDE, a renda da classe média cresceu um terço menos do que a renda dos 10% mais ricos.
"O estilo de vida da classe média normalmente é associado com certos bens e serviços e certas condições de vida, como moradia decente, boa educação e acesso a um bom serviço de saúde. No entanto, os preços de bons serviços de saúde, educação e moradia aumentaram muito acima da inflação", explica o estudo.
A concentração geográfica dos melhores empregos fez com que o preço da moradia subisse muito nas grandes cidades. A moradia é responsável por uma parte cada vez maior dos gastos dos lares de classe média. Entre 1995 e 2015, ela aumentou de um quarto da renda para quase um terço.
O envelhecimento da população e novas tecnologias médicas aumentaram o custo de serviços privados de saúde, achatando ainda mais a classe média.
Além disso, a competição no mercado de trabalho pressiona os pais a investir mais e mais em educação, enquanto os serviços do setor se tornam mais caros.
O economista Joelson Sampaio, coordenador do curso de economia da FGV (Fundação Getúlio Vargas), explica que há mais um fator-chave para esse endividamento, especialmente no Brasil.
"Com mais dificuldade de acesso a renda, as pessoas acabam recorrendo ao mercado de crédito", diz ele. "E quando deixam de pagar, a inadimplência aumenta o endividamento. Muitos lares acabam comprometendo uma parcela significativa da renda para pagar juros."
Isso acaba tendo um um efeito de desaceleração do consumo e da economia, o que faz com que a renda cresça menos ainda e gera um círculo vicioso.
Conforme os gastos suplantaram a renda, a capacidade de poupar da classe média caiu muito. Ela despencou entre 2007 e 2010 e ficou estagnada entre 2010 e 2015.
O Brasil se difere da maioria dos países da OCDE em relação ao peso de alimentação e vestuário tem no orçamento das famílias. Na maioria dos países da organização, comida e roupas correspondem a menos de um quarto dos gastos.
No Brasil e na África do Sul, alimentação e vestuário são quase um terço dos gastos dos lares de classe média.
"Com o aumento do custo de vida e gastos crescendo mais rápido do que da renda, muitos lares de renda média têm dificuldade de chegar ao fim do mês. Alguns se tornaram financeiramente vulneráveis, e outros gastam mais do que ganham", diz o estudo.
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