O povo não gosta daquilo que não entende. E Bolsonaro capricha na falta de nexo. Segundo a superstição vendida na campanha eleitoral, o capitão seria um político honesto que, uma vez eleito, faria um governo isento de malfeitorias. Como evidência de suas boas intenções, transferiu Sergio Moro da Lava Jato para a pasta da Justiça. À frente da Polícia Federal, o ex-juiz faria um "juízo de consistência" sobre as denúncias, apressando providências saneadoras.
Pois bem, submetido a uma oportunidade concreta de demonstrar que fala sério, Bolsonaro decide tratar a encrenca a golpes de barriga. O presidente dá a entender que não cogita tratar investigados como condenados. Faz bem. Ninguém ousaria pregar a extinção do sacrossanto direito de defesa. O que não parece razoável é que suspeitos de crime permaneçam na Esplanada como se nada tivesse sido descoberto sobre eles.
Admita-se que Bolsonaro não queira demitir o único ministro do seu partido, o PSL. Poderia, então, adotar uma solução à moda de Itamar Franco, que ordenou ao então chefe da Casa Civil Henrique Hargreaves que se licenciasse do cargo assim que foi alvejado por denúncias de corrupção. Fora do governo, Hargreaves livrou-se das acusações. E retornou à antiga função.
Parece haver um quê de autodefesa na decisão de Bolsonaro. O presidente enfrenta, ele próprio, o assédio de incômodas interrogações. Há o amigo Fabrício Queroz, que ele encostou na biografia do filho Flávio Bolsonaro. Há o laranjal plantado por Queiroz na folha do gabinete de Flávio. Há os R$ 24 mil que Queiroz borrifou na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro. Afastando o ministro do Turismo, Bolsonaro perderia um de seus anteparos, tornando-se alvo solitário.
Bolsonaro sinaliza que, no momento, a prioridade de sua Presidência não é a ética. Ou a falta dela. O governo dedica-se a desfazer as polêmicas presidenciais e convencer o Congresso de que não haverá prosperidade sem reforma da Previdência. Beleza. O diabo é que um dos incômodos do brasileiro é essa interminável sensação de que nada se perde, nada se transforma na política. Tudo se corrompe. Ao prolongar o 'orange shower' do seu ministro do Turismo, Bolsonaro atrai o jorro de perversões para sua própria cabeça.
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