Há eleitores que estão assustados com a falta de segurança. E não gostam das lideranças e movimentos que criticam a ação da polícia quando esta se mete em confrontos e mata bandidos. Acham que é preciso mais e não menos polícia. Mas não são justiceiros. São pessoas que têm medo de sair de casa, ficam preocupadas com os parentes que demoram a voltar. Assim, compram o discurso que a polícia precisa endurecer, mesmo que Bolsonaro não diga como será a política de segurança. Também aprovam a redução da maioridade penal e uma maior liberação da posse de armas.
Mas, atenção, não são pessoas que estão prontas para comprar armas e sair matando bandido. Lembram-se do referendo do desarmamento? Uma imensa maioria manifestou-se contra a proibição da venda de armas. E não houve aumento na venda de armas.
Há uma classe média que está farta do peso do Estado e do governo em suas vidas. Gente que não consegue abrir um negócio legalmente sem pagar propinas ou mesmo sem pagar taxas abusivas antes de começar a trabalhar. Gente que paga imposto demais e ainda percebe que precisa colocar seus filhos em escola particular e comprar plano de saúde.
Há também na onda Bolsonaro os eleitores liberais no sentido amplo da palavra: liberais na política, na economia e nos costumes. Na economia, pedem um Estado menor e mais espaço para a iniciativa privada. Na política, apoiam as posições e grupos independentes de partidos. Nos costumes, não é que sejam contra a “agenda progressista” (raça, gênero, etc.), mas acham que o Estado não tem que se meter nisso e deixar que cada um resolva como quiser o seu modo de vida. Ou seja, são contra a imposição daquela agenda, ou por lei (cotas, por exemplo, que consideram injustas) ou por pressão das elites e formadores de opinião. Mas frequentemente, são favoráveis a agendas como a liberação da maconha.
Mas há também eleitores que simplesmente estão cansados da agenda progressista. Acham que não tem nada a ver com o dia a dia. Querem saber de emprego e bons serviços públicos.
Há ainda uma maioria difusamente conservadora, pela família, religião, Brasil. E que se assusta com a “libertinagem” da sociedade moderna e do que considera coisa das elites que não trabalham.
E, claro, os antipetistas, antipolíticos, anticorrupção – vertente na qual cabem todas as anteriores. Aqui encontram-se eleitores que dizem: não precisa de reforma da previdência, nem aumentar impostos, nem cortar gastos, nada; basta eliminar a roubalheira e os privilégios dos políticos.
Tudo considerado, essa grande maioria não é formada por fascistas, homofóbicos, autoritários ou violentos. Há os radicais, perigosos, certamente, mas no geral são pessoas de bem, que pouco a pouco foram ficando fartas de um país que não deslancha, que não cria bons empregos. Estão cansadas de viver em cidades em que passar perto de um tiroteio, ter o carro roubado ou ser assaltado na rua é tão normal que nem vale a pena chamar a polícia. Deve-se incluir aí uma classe média mais rica, assustada com a escassez de oportunidades para seus filhos.
Como esse povo todo foi parar em Bolsonaro? Por pura falta de opção.
Mais ainda: as pessoas, cada uma de seu lado, reconhecem as carências de seu candidato. “Sim, ele é fraco, mas se a gente aguentou tanto tempo o PT …” já me disseram.
Outras ainda têm certeza que sua agressividade é da boca para fora, que não haverá ameaça à democracia e à liberdade das pessoas.
Resulta daí um enorme problema. Com essa massa, Bolsonaro ganha a eleição, mas terá dificuldades para governar. Ele certamente está sendo eleito para fazer e para não fazer a reforma da previdência. Para privatizar e para estatizar – só para citar dois pontos cruciais. Ou seja, o governo vai incluir e excluir eleitores. E ainda não se sabe como.
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