A primeira: por que um museu deve depender de uma universidade? Nada contra as universidades, mas não é esse seu objetivo básico. Um museu exige muito – muita dedicação, muito estudo, muito dinheiro, administração própria. O Museu Nacional, sob a Universidade Federal do Rio de Janeiro, não tinha um contrato de manutenção elétrica – pelo menos não constava na prestação de contas da UFRJ. O Museu do Ipiranga faz parte da USP, Universidade de São Paulo. Seu prédio estava em condições tão precárias que foi fechado em 2013 para reformas, com reabertura prevista para 2022. Nove anos fechado.
Há pouco mais de 20 anos, o empresário Israel Klabin, ex-prefeito do Rio, conseguiu US$ 80 milhões do Banco Mundial para restaurar e modernizar o Museu Nacional. Só havia uma exigência: o Museu deveria ser autônomo. Ou fundação ou Organização Social, com conselho, compliance (compromisso de seguir as leis, com transparência) e governança. Um grupo de voluntários se formou para trabalhar num pré-projeto de reforma para apresentar ao Banco Mundial. Mas a UFRJ rejeitou a proposta: o Museu era dela e ponto final. Os R$ 600 mil anuais da manutenção foram sendo reduzidos desde 2014. A receita da UFRJ cresceu, a verba do Museu caiu. Detalhe: um secretário de Estado, Wagner Victer, previu em 2004 o incêndio, por falta de manutenção.
Não se trata, aqui, de apontar responsáveis pelo incêndio: isso é tarefa dos investigadores. Na nota acima, falou-se das estruturas administrativas inadequadas, que é preciso modificar. Aqui, sem culpar ninguém, o tema é outro: a unanimidade ideológica no comando de uma universidade pública.
O reitor, a vice-reitora, a pró-reitora de Extensão, o pró-reitor de Pessoal são simpáticos ao PSOL; o pró-reitor de Graduação é simpático ao PCB; o pró-reitor de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças é simpático ao PCdoB. Não existirá nenhum professor capaz de exercer algum desses cargos e não seja simpatizante de algum partido de extrema esquerda?
Haveria a possibilidade de que a UFRJ tenha sido entregue a esses partidos em um “acordo de governabilidade” com os governadores Sérgio Cabral e Pezão?
“Todos que por aqui passem protejam esta laje, pois ela guarda um documento que revela a cultura de uma geração e um marco na história de um povo que soube construir o seu próprio futuro”.
Era isso que estava escrito no chão, em frente ao Museu Nacional da Quinta da Boa Vista, Rio de Janeiro.
Cala-te, boca!
Este colunista ouviu, ninguém lhe disse: o ministro da Cultura, Sérgio de Sá Leitão, disse que a restauração do Museu se dará em várias fases, a última das quais é comprar o que for necessário para recompor o acervo que o fogo destruiu.Claro, claro: é só ir às compras que, mesmo pagando mais caro, será simples comprar fósseis de plantas já extintas, o fóssil de Luzia – que, aliás, já estava velhinho, com 12 mil anos – e que levou o mundo inteiro a refazer as pesquisas sobre a chegada dos seres humanos à América; talvez, por que não?, outro trono, para substituir o perdido, do rei africano do Daomé, Adandozan, na hipótese ainda não comprovada de que ele tivesse duas bundas.
Já repor o acervo de múmias será simples. Basta promover um evento com determinadas autoridades e fechar as portas. A turma se sentirá em casa.
“Para liquidar os povos, começa-se por lhes tirar a memória. Destroem-se seus livros, sua cultura, sua história. E uma outra pessoa lhes escreve outros livros, lhes dá outra cultura e lhes inventa outra História.” Do escritor tcheco (naturalizado francês) Milan Kundera, O Livro do Riso e do Esquecimento.
Carlos Brickmann
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