Poderia parecer estranho, mas se Lula fora condenado e obrigado a sair da cena política, a maior orfandade poderia ser da direita. Foi, de fato, nos Governos de Lula e Dilma Rousseff que a direita adquiriu maior peso político. Os principais ministros e assessores de Temer já o tinham sido nos quatro mandatos da esquerda. Foi com o PT no Governo que a direita estendeu seus tentáculos em todos os órgãos do poder que hoje mantém.
Se Lula for impedido de disputar a presidência, é possível que cresça um candidato progressista disposto a continuar combatendo a corrupção. Por que essa direita temeria mais, por exemplo, a ecologista Marina Silva ou o ultradireitista Jair Bolsonaro do que Lula? Ou um Joaquim Barbosa, um Ciro Gomes e até um Luciano Huck? Porque esses políticos alternativos a Lula não parecem dispostos a acabar com a Lava Jato. Bolsonaro já anunciou que, se ganhar, designará o juiz Sérgio Moro para o Supremo.
Lula é um candidato que nunca infundiu medo na direita enquanto esteve no poder. Quando disputou as eleições em 1989 e perdeu para Fernando Collor de Mello, confessou que tinha sido melhor para o país já que “ainda não estava preparado para governar por ser muito radical”. Foi José Dirceu, o dirigente do PT posteriormente condenado à prisão, que “pôs a gravata em Lula”, como escreveu este jornal na época. Dirceu o fez cortar a barba de sindicalista, vestir-se com elegância e reconciliar-se com os valores neoliberais da economia. E ganhou duas eleições.
Fernando Haddad, um intelectual do PT especialista em marxismo, considerado o estepe de Lula, recomendou a ele que, desta vez, leve o PT mais para a esquerda. Lula sabe, porém, que se voltar ao poder não poderá governar sem o apoio da direita. O que deve ter agradado a Lula foi o golpe publicitário de Haddad, que o batizou de “viagra dos brasileiros”. Pediu que, no Brasil, essa pílula “tenha a cor vermelha de Lula”, o único político, segundo ele, capaz de “devolver o tesão” aos brasileiros. A mensagem subliminar de Haddad é clara: desde que Lula saiu, os brasileiros ficaram impotentes para seguir adiante, teriam perdido seu fogo, algo que só o ex-sindicalista saberia devolver.
Essa direita, órfã de candidatos, cujo sonho é apagar o incêndio da Lava Jato para poder sobreviver tranquila, sabe que Lula, maleável por temperamento, seria mais compreensivo nos labirintos e negociatas da velha política que qualquer outro presidente da esquerda e até do centro. Poderia parecer um paradoxo, mas essa direita, com medo de acabar na prisão, na qual figura meio Congresso, não choraria se Lula fosse absolvido nesta quarta-feira e pudesse disputar as eleições. E, melhor ainda, se ganhasse.
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