A disputa em torno de Belo Sun deveria estar no centro do debate público no Brasil. Mas não está. O que acontece na Amazônia tem efeitos no clima do país e do planeta, mas a Amazônia segue longe demais. Como tão poucos se importam, os violentos se sentem à vontade para agir violentamente, quem discorda é repelido ou mesmo ameaçado e a tensão tornou-se um estado permanente na região.
Prefeito irceu Biancardi (PSDB): em nome da empresa |
O momento é grave e os brasileiros, do sul ao norte, precisam compreender algo que deveria ser ensinado nas escolas: na Amazônia, acontece primeiro.
Em 6 de dezembro, o Tribunal Regional Federal da 1a Região suspendeu por tempo indeterminado o licenciamento de Belo Sun e determinou que os povos indígenas sejam ouvidos como determina a Constituição brasileira e a legislação internacional. Esta foi uma vitória, mas uma vitória que todos os envolvidos sabem que pode ser apenas temporária. Se a mineradora canadense avançar sobre o ouro da Amazônia, a Volta Grande do Xingu será duplamente impactada e ninguém poderá prever o tamanho do efeito na floresta, nos rios e na alteração do clima. É correto afirmar que não se destrói a floresta aqui sem perder qualidade de vida em toda parte.
Hoje, Belo Monte converteu-se numa obra ligada à corrupção, à violência contra os povos da floresta e à devastação da Amazônia. Altamira, a principal afetada pela construção da barragem, tornou-se a cidade (com mais de 100 mil habitantes) mais violenta do Brasil. À Belo Monte já está colado um significado negativo. Mas enquanto ela foi construída, os que denunciavam os acordos e as violações eram chamados de “inimigos do progresso” e a maior parte da população brasileira ou defendeu a hidrelétrica ou se omitiu.
A história hoje se repete com Belo Sun, defendida nos eventos públicos por representantes da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Pará, a licenciadora da obra, e pelo prefeito de Senador José Porfírio com ardor igual ou superior aos próprios representantes da mineradora canadense. A ênfase é no dinheiro que entrará para os cofres públicos, no “progresso” para uma região “pobre” e nos supostos empregos. O agravante é que a história se repete num governo dominado pelos que se chamam de “ruralistas”, fiadores de um presidente denunciado duas vezes e salvo duas vezes por um Congresso corrupto. Se os atos de exceção têm se repetido no centro-sul do país, é possível alcançar o tamanho da desenvoltura de grileiros e desmatadores na região amazônica.
Sobre Belo Monte, ainda se podia alegar que era uma obra para produzir um bem público – energia –, embora já estava bastante claro que o objetivo principal era outro. E podia se alegar também que era uma obra do Estado construída por empreiteiras privadas e explorada e administrada por um consórcio de empresas públicas e privadas. E sobre Belo Sun? Qual é o benefício de arrebentar ainda mais a floresta e especialmente uma região que já sofreu grande impacto para que uma empresa canadense possa extrair toneladas de ouro e depois sair do país deixando uma montanha de rejeitos tóxicos? Seria obrigatório que o Canadá, país que posa de bom moço no mundo, se manifestasse sobre o que está sendo feito em seu nome na Amazônia brasileira.
A disputa em torno de Belo Sun, porém, está fora do debate central do país, tomado pela Lava Jato e pela eleição de 2018. Quem faz a principal resistência à implantação de uma mineradora canadense que pretende tirar dezenas de toneladas de ouro de uma floresta que tem impacto sobre o planeta é um punhado de homens e mulheres indígenas, especialmente os corajosos Juruna da aldeia Muratu, Terra Indígena de Paquiçamba, na Volta Grande do Xingu. Mas eles estão sozinhos demais.
Num país com tamanho de continente, parece que poucos além dos indígenas enxergam que a mina é a floresta – e não o ouro que se vai.
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