O 'ex-ministro'
Houve um tempo em que fugitivos da justiça, em geral, eram criminosos endurecidos pela áspera vida no sub-mundo dos fora-da-lei – gente de cara ruim e sem gravata, capazes de trocar tiros com a polícia e de meter medo em todo mundo. Mas o Brasil, como se sabe, passou por um notável processo de ascensão social nos últimos anos – e um dos resultados talvez tenha sido um up-grade, como se diz, no tipo de indivíduo que aparece atualmente na imprensa na condição de foragido das autoridades. Para começar, já não são revelados ao público no noticiário policial — migraram para o noticiário político. Podem viajar de avião, têm casa própria e compraram o seu carrinho. Também não são mais aqueles sujeitos sinistros que em geral povoam o mundo do crime (esses continuam existindo, claro, mas suas fotos já nem chegam mais à imprensa – são tantos, que acabaram perdendo a graça). Hoje o tipo clássico do fugitivo da polícia é um desses Antonio Carlos Rodrigues da vida, para citar o exemplo mais recente, que acaba de entregar-se à PF de Brasília após passar uns quatro ou cinco dias escondido. Seu crime é exatamente aquilo que você imagina: ladroagem, no caso um esquema de propinas despachadas pelos cofres do inevitável empresário Joesley Batista (campeão nacional dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff) que no momento trafega entre as operações “Chequinho” e “Caixa d’Água” da Polícia Federal. É coisa em que também está metido o ex-governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho, outro grande nome da política que no momento mantém residência no sistema carcerário nacional.
O foragido da vez era até há pouco tempo um transeunte no baixo clero da política brasileira, na condição de presidente do PR – um desses bandos que se formam para vender apoio aos governos, quaisquer que sejam, em troca de cargos públicos, dinheiro e outros benefícios materiais. Também operam no lucrativo mercado da venda de minutos no “programa eleitoral” obrigatório no rádio e TV — esta fortaleza que defende o acesso dos menos favorecidos às informações políticas e garante as eleições livres neste país. Como as outras gangues partidárias que vivem no mesmo ecossistema, são tratados como essenciais para a sobrevivência da democracia no Brasil, segundo o entendimento dos mais ilustrados cérebros do nosso Direito, Ciências Políticas e demais disciplinas que se dedicam a nos ensinar o que é uma sociedade de justiça social, igualdade e respeito às minorias. Antonio Carlos — que foi preso, mas pode perfeitamente estar negociando daqui a pouco, de dentro ou de fora da cadeia, o seu apoio a algum futuro candidato à presidência da República – apareceu no noticiário, mais do que tudo, como chefe de “um partido que apoia Michel Temer”. Foi citado também como “ex-ministro”. Fora isso, pouco mais foi dito nas notícias.
Tudo bem, mas “ex-ministro” do que? De que governo? Durante quanto tempo? Se tiver paciência para fazer uma rápida pesquisa, o cidadão descobre que esse Antonio Carlos foi ministro dos Transportes. Foi ministro da ex-presidente Dilma Rousseff, e de mais ninguém nessa vida. Foi ministro durante todo o segundo mandato de Dilma – do dia 1º. de janeiro de 2015, quando ela tomou posse, até 12 de maio de 2016, quando foi afastada do cargo pelo Senado Federal e começou a contagem regressiva até a sua deposição definitiva. Ninguém é ministro por acaso durante um governo inteirinho – se ficou lá do primeiro ao último dia é porque a presidente gostava muito dele. Seu partido ficou grudado no osso do governo até o caixão baixar à cova. A soma de todas as suas realizações em benefício dos Transportes no Brasil chegou ao total de zero.
Culpa do governo Temer, sem dúvida.
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