Ministro da Fazenda de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardozo fez o ajuste fiscal e um plano de estabilização da economia que deram tão certo que acabou presidente da República. Foi eleito graças ao fim da hiperinflação. Seu governo fez a reforma patrimonial do Estado (privatizações) e adotou uma política social liberal, que consistiu na focalização dos gastos sociais nos mais pobres. As políticas sociais universalistas enfrentaram grande restrição de recursos, mesmo assim, foram inovadoras em alguns aspectos, entre os quais a universalização do ensino básico, sob comando do ex-ministro da Educação Paulo Renato, já falecido, e alguns êxitos importantes na saúde pública, como o controle da epidemia de Aids e a produção de medicamentos genéricos, com a quebra de patentes internacionais, mérito do senador José Serra (PSDB-SP).
Tudo parecia caminhar na direção da transformação do Brasil numa potência emergente, com uma classe média numerosa, mas o naufrágio era iminente. As manifestações de 2013 foram o recado dos jovens de que as coisas não estavam indo bem, apesar do oba-oba em torno da Copa do Mundo. Além disso, os sintomas de que a corrupção era sistêmica e fora organizada de cima pra baixo já eram aparentes. Mesmo assim, Dilma foi reeleita em 2014, quando a economia já mandava sinais de que o seu motor estava pifando.
Dilma ganhou o segundo mandato, mas não levou. O impeachment foi mais um ponto fora da curva, como o de Collor de Mello, mas uma decorrência de seus erros. Dilma não soube aproveitar as oportunidades, potencializou todas as ameaças, anulou os pontos fortes de seu governo e não compensou nenhum de seus próprios pontos fracos. O que parecia impossível aconteceu: perdeu o mandato de presidente da República com o povo na rua pedindo sua cabeça, enquanto o PT, acuado, procurava preservar suas forças com a narrativa do golpe e a candidatura de Lula a presidente em 2018.
Chegamos ao governo de Michel Temer, que não somente articulou a queda de Dilma, como herdou seu sistema de alianças, expurgado do PT e seus satélites de esquerda. A antiga oposição se incorporou ao governo, dando-lhe legitimidade e base de apoio no Congresso para enfrentar as adversidades. No caso, foram duas denúncias do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot, ambas rejeitadas pela Câmara, da qual Temer foi presidente três vezes. Soube neutralizar pontos fracos e conter ameaças para preservar o mandato.
Temer reverteu a recessão e retomou o crescimento; jogou a inflação abaixo de 3,5% ao ano, com uma taxa de juros que deve chegar a 7%. Teria tudo para ter o mesmo sucesso de Itamar Franco e emplacar um sucessor, mas está longe disso. Além do desgaste provocado pelo envolvimento na Operação Lava-Jato, o governo parece não dar a menor bola para a questão social, haja vista a portaria sobre trabalho escravo, num país com 13 milhões de desempregados declarados. Não tem política de emprego, a face mais perversa da crise social, que cresce vegetativamente, a ponto de os indicadores de 2017 serem superiores aos de 2016, porque o ingresso de jovens no mercado de trabalho é superior à geração de novos postos de trabalho, que este ano atingiu 1 milhão de postos. O mais grave, porém, é a crise de segurança pública, na qual a violência urbana, principalmente no Rio de Janeiro, escandaliza o país e o mundo.
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