sexta-feira, 30 de junho de 2017

A Princesa e o Infante

Conta a lenda que dormia/ Uma Princesa encantada. São os primeiros versos de um dos mais instigantes poemas de Fernando Pessoa, “Eros e Psique”. Publicado, na revista Presença, em maio de 1934. Como epígrafe, palavras de um Ritual dos Templários (“Assim vêdes, meus irmãos...”). Nada a estranhar. Que Pessoa era dado ao misticismo. Ele mesmo confessou, em carta a sua tia Anica (24/6/1916), ter começado a ser médium. Era capaz de prever o futuro. O suicídio do amigo Sá Carneiro, em Paris. O fim de Salazar. E sua própria morte. Não se poderia esperar é que fosse também capaz de, naquele tempo, saber o que se passa hoje no Brasil.

A Princesa encantada dos versos penso que é Dilma. Dando-se que dita Princesa encontra Um Infante que viria/ De além do muro da estrada (todas as citações são do poema). E esse Infante penso é Temer. Que veio de De além do muro (do PMDB). Só que dito Infante tentava deixar O caminho errado/ Por que à Princesa vem. Nenhuma novidade. Que até bilhetinhos queixosos mandou, para ela. Enfim O Infante, esforçado/ Rompe o caminho fadado. Com o impeachment. E acabaram se afastando. A partir daí, Ele dela é ignorado/ Ela para ele é ninguém. Sugerindo, Pessoa, que Cada um cumpre o Destino. Mas qual será tal Destino?, eis a questão.


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A Princesa Dilma parece não ter ânimo para novas aventuras eleitorais. Devolveu a seu mentor, e criador, o comando. Não será suficiente. Lula jamais a perdoará por não lhe ter cedido lugar antes, em 2014. Tanto que já publicamente atribui, às medidas desastrosas tomadas pela Princesa, a crise do PT. Sem piedade. E aposta todas as fichas em um improvável “Diretas Já”. Que teria que vir antes de ficar inelegível, por conta da Lei da Ficha Limpa (LC 135/2010).

Enquanto isso o Infante Temer, depois da denúncia de Janot (nesta segunda), já não parece ter condições para governar. Tornou-se um espantalho. “Uomo de paglia”, como dizem os italianos. Era carne, hoje é só palha seca. Rocha Loures, amigo íntimo que amava passear com malas endinheiradas, está preso. O Infante diz “duvidar de sua delação” (Folha SP, 3/6). Rezando pelo silêncio do assessor. Palavras erradas, senhores meus. Deveria pedir é que dissesse tudo. Quem seria o desconhecido beneficiário dessa propina. Porque, fora disso, acaba sendo legítimo acreditar fosse o próprio Infante.

Resumindo, hoje, dito Infante quer só permanecer no cargo. As reformas vão sendo desfiguradas, em busca de apoios. O fim do imposto sindical, por exemplo, já foi trocado por uma certa condescendência das centrais sindicais. E familiares têm seus imóveis restaurados com grana suja. Tudo como já vimos, antes, com outros.

Seu governo, a cada dia, fica melancolicamente mais parecido com o daquela Princesa que sucedeu. Semana passada, chamou o rei da Noruega de rei da Suécia. Frase digna da própria Dilma. Até ministros e assessores são os mesmos. E a gula por grana é a mesma. Só a equipe econômica se salva, graças ao bom Deus. Se o Infante aceitar conselhos, talvez pudesse ouvir o de Pablo Neruda (na sua “Canção Desesperada”): “É hora de partir. Oh Abandonado”.

O final do poema de Pessoa é profético. Ele imagina o Infante olhando para sua Princesa. Com A cabeça em maresia, ainda pensa que seus destinos poderiam ser diferentes. Embora saiba, no íntimo, que vão ser iguais. Todos sabemos. Afinal, como anunciado por Pessoa nos versos finais do poema, o Infante Ergue a mão, e encontra hera,/ E vê que ele mesmo era/ A Princesa que dormia.

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