quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Quanto os brasileiros pagam por não viverem em paz?

Desde o começo do ano, mais de 130 pessoas perderam a vida em meio aos conflitos que se multiplicam nos presídios, mortes que são apenas o aspecto mais evidente da crise crônica de violência vivida pelo país.

A cada ano, cerca de 60 mil pessoas são assassinadas no Brasil, o que equivale a uma taxa de 29 homicídios por 100 mil habitantes, números excepcionalmente altos para um país que não está em guerra, segundo dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

Para tentar entender o custo econômico que a violência impõe aos brasileiros, a BBC Brasil conversou com especialistas que organizam diferentes estudos sobre o assunto.

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Os levantamentos apontam impactos que podem oscilar de 3,78% a 13,5% de toda a riqueza produzida anualmente, dependendo dos fatores avaliados. Mas independentemente da proporção percentual, trata-se de centenas de bilhões de reais saídos dos bolsos dos brasileiros.

Na última sexta, foi divulgado um relatório do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) que estimou o gasto com violência em 16 países da América Latina e Caribe.

O estudo mostrou que em 2014 o crime custou ao Brasil 3,78% do seu PIB (Produto Interno Bruto), o equivalente a US$ 124 bilhões (R$ 386 bilhões).

Segundo o relatório, os gastos públicos com crime são seis vezes maiores do que os investimentos com o programa social Bolsa Família, por exemplo.

O estudo ressalta ainda que seu cálculo é conservador - avalia o impacto dos homicídios em 0,23% do PIB, enquanto um estudo do pesquisador Daniel Cerqueira, do Ipea, sugere 0,61%. "O custo dos homicídios pode ser consideravelmente mais alto que as nossas estimativas", diz o documento.

Para Cerqueira, o banco se ateve a estimativas modestas porque é necessário encontrar uma referência padronizada entre todos os países pesquisados para poder traçar um comparativo.

"Talvez, para acomodar todas essas nações, eles não cheguem a calcular muitos detalhes, como nós fizemos em outros estudos", sugere.

O economista contribuiu para o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que na edição de 2014 estimou o gasto do Brasil com segurança em 5,4% do PIB. Nessa soma entram policiamento, prisões e unidades de medidas socioeducativas - mas ficam de fora investimentos militares, por exemplo.

Cerqueira afirma que os valores mais atuais excedem essa estimativa: "Pelos meus cálculos, o custo da violência hoje está em 5,9% do PIB. Desses, 1,4% é gasto com segurança, 0,4% é gasto com sistema prisional. Outros 2,5% é o custo intangível, que tem a ver com as mortes por homicídios. Além disso tem 1,6%, que é a soma dos custos com segurança privada e com seguro."

O principal estudo mundial sobre o tema, o Índice Global da Paz, inclui o orçamento das Forças Armadas em seu cálculo.

O ranking anual é publicado pelas ONGs Vision of Humanity e Instituto para Economia e Paz. De acordo com a última edição, o Brasil está na posição 105 entre 162 países - um retrocesso em relação à centésima posição obtida em 2015.

O relatório serve de base para um estudo mais detalhado, chamado O Valor Econômico da Paz, que afirma que a violência custa ao mundo anualmente US$ 13,6 trilhões, ou US$ 1.876 dólares por pessoa, em valores ajustados por paridade de poder de compra.

Desse montante, US$ 1,79 trilhões estão relacionados a homicídios, tipo de violência preponderante na América Latina e no Brasil.

Esse levantamento explora o conceito de "preço" da violência em custos diretos e indiretos e avalia que o Brasil perdeu em 2016 mais de US$ 338 bilhões - ou seja, mais de R$ 1 trilhão - com o problema.

Por esse cálculo o Brasil, desperdiça cerca de 13,5% do seu PIB com violência. Na média são US$ 1.640, ou R$ 5.140, para cada cidadão ao ano.

Nesse número estão contabilizados gastos diretos com orçamento militar, policial, judicial e em saúde pública, além de perdas indiretas como o prejuízo da queda em produtividade de sobreviventes traumatizados.

O cálculo também estima a redução do desenvolvimento econômico gerado pelo conflito prolongado e pela perda de vidas produtivas.

"A violência contínua destrói o capital humano e físico, o que por outro lado restringe o ambiente de negócios, dificultando a construção de uma paz duradoura", explica Camilla Schippa, pesquisadora do instituto.

Segundo ela, o homicídio custa muito caro para países emergentes, como o Brasil e o México.

"As empresas precisam investir na proteção de seus funcionários com câmeras de segurança, guardas, seguros, etc. É um custo que torna o país menos competitivo, pois esse dinheiro poderia estar indo para aumento de produção, pesquisa e desenvolvimento. Nosso relatório mostra que altos níveis de violência afetam negativamente o investimento estrangeiro direto, o turismo e afins."

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