Pawel Kuczynski |
Assim, seria razoável olhar com bons olhos a PEC 47/2016. O texto, porém, apresenta sérios inconvenientes. Em primeiro lugar, ele inclui o Poder Judiciário como possível espaço para o exercício do lobby. Ora, na esfera judiciária, a defesa de interesses já tem um trilho bem definido, que é o processo judicial. A admissão de outras vias seria conferir um indevido caráter político ao Judiciário, cuja missão institucional exige precisamente uma delicada isenção. Definitivamente, o Judiciário não é território para o lobby.
Outro grave defeito da PEC 47/2016 está em abrir a possibilidade de se conceder aos “agentes de representação de interesses” prerrogativas que de modo nenhum devem ter. Por exemplo, segundo a proposta, as entidades federativas poderão conceder aos lobistas do Poder Legislativo o “direito a voz no âmbito de reunião de comissão; direito à apresentação formal de emendas a proposições; direito ao acompanhamento pessoal da tramitação de matéria de seu interesse, vedado o acesso aos ambientes exclusivos de parlamentares; direito de acostar memoriais e documentos a proposições de seu interesse”.
Ao tratar dos lobistas do Poder Executivo, a PEC também vai além do razoável, e menciona a possibilidade de lhes conceder o “direito de acostar memoriais e documentos aos processos de seu interesse”.
A concessão de tais prerrogativas é um evidente exagero. No caso do Legislativo, os lobistas são presenteados indevidamente com o instituto da representação: poderão apresentar emendas e propostas como se parlamentares fossem. No caso do Executivo, o texto é vago a ponto de admitir interferências em qualquer etapa do processo de elaboração de projetos e estudos.
O exercício da atividade de representação de interesses não requer esse tipo de atuação, com intromissões diretas e extemporâneas. Afinal, um dos objetivos da regulamentação do lobby é estabelecer uma clara e saudável distinção institucional entre o lobby e o exercício do cargo de parlamentar ou das atribuições executivas. A propositura de emendas em projetos legislativos, principalmente, deve continuar sendo prerrogativa exclusiva dos parlamentares, para que não haja dúvidas quanto à vigência do sistema representativo.
A regulamentação do lobby só tem sentido se reforçar a representação política prevista na Constituição, que se dá exclusivamente por meio do voto. Uma legislação sobre o tema deve garantir transparência ao trabalho do lobista, permitindo o acompanhamento pela sociedade da lisura e da legitimidade dos interesses defendidos por meio dessa atividade. Afinal, o objetivo da regulamentação não é aumentar o poder do lobby. É torná-lo mais visível e, assim, mais controlado.
Editorial - Estadão
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