quarta-feira, 25 de maio de 2016

Por qual TV lutamos?

Poucos dias antes da votação do impeachment, a presidente Dilma Rousseff nomeou um novo presidente da EBC, o jornalista Ricardo Melo, com mandato até 2020. É bizarro que um governo com menos de uma semana pela proa faça nomeações importantes com mandato dessa extensão. Ao assumir, Michel Temer naturalmente exonerou o candidato de sua antecessora e nomeou o também jornalista Laerte Rimoli. Ricardo Melo entrou com uma ação no STF, e as duas partes reclamam o direito de ter feito o que lhes parecia o correto.

O caso não teria implicações maiores, não fosse a EBC uma empresa constituída com o fim de criar a TV Brasil, conhecida na intimidade por TV Lula. Disfarçada de televisão pública, a TV Brasil tem sido até agora uma televisão estatal. Não apenas integrava a máquina publicitária do governo petista, como praticava ilícito maior, aparelhando-se de forma análoga a outras empresas do governo.


Tratando-se de empresa de comunicação — ironicamente Empresa Brasil de Comunicação — e controladora de uma rede nacional, o caso ganha maior gravidade. Ela absorveu emissoras estatais — NBR, Radiobrás — e, misturando-as à antiga TVE, procurou passar a impressão de que tudo era a mesma coisa. Não era. A EBC abriu os cofres do Estado prometendo construir uma televisão pública — o que seria nobre e necessário — para, na verdade, criar uma máquina de propaganda governamental cara, ineficiente e ilegítima.

Alguns dos mais ousados e bem-sucedidos modelos de excelência em televisão são públicos, a começar pela BBC. Públicos, mas não estatais. A televisão desconhece inovações que tenham nascido em berços do Estado. Desde que a TV Lula foi implantada, surgiu a possibilidade que, numa cultura televisiva bastante sólida como a brasileira, e em meio a um cenário de bom desempenho financeiro mas alto engessamento das emissoras privadas, a televisão pública pudesse se impor como fiadora do gosto popular, do trabalho com a expressão, da construção mínima de uma televisão brasileira não comprometida com o desempenho meramente comercial.

Mas, nos seus nove anos de existência, a TV Brasil não investiu um centavo no que deveria ser sua obrigação: renovação de linguagens, desenvolvimento de formatos, geração de talentos, ousadia formal e vanguarda tecnológica. Agora, quando se discute quem tem o direito de nomear sua direção, isso é prioritário e urgente. Já perdemos tempo demais investindo o dinheiro da população brasileira para lhes devolver novelas angolanas e pregações populistas, onde deveria estar o refinamento de soluções televisivas.

O Brasil tem uma sólida estrutura de TV privada. São emissoras amadas pelo público, mas que muitas vezes não podem investir no novo, sob pena de perder posições de mercado. Cabe ao Estado ousar, apostar no inusitado, criar outros modelos de televisão, montar uma TV que esteja à frente de seu tempo, e não a reboque do velho, do ineficiente e do arcaico.

A ferramenta que dispõe para isso hoje é a EBC. Ele só tem então duas opções: ou exerce o seu direito de, com o dinheiro da população, criar novos paradigmas de televisão, ou tranca a porta, joga fora a chave e vai gastar o dinheiro do povo em outro lugar.

Nelson Hoineff

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