sábado, 19 de dezembro de 2015

De '1968 (livro de Zuenir) ao Supremo do ocaso de 2015'

Vai chegando ao fim (feliz ou infelizmente) este incrível ano de 2015. Doze meses vividos com máxima intensidade, tensão e emoção à flor da pele. Do começo trôpego e atrapalhado na posse de Dilma Rousseff e ministros, em seu segundo mandato, ao desfecho desconcertante que se viu e ouviu esta semana, nas últimas sessões e decisões da Suprema Corte de Justiça da Nação sobre o impeachment da presidente da República, a partir das primeiras decisões da Câmara de Eduardo Cunha, e manobras de Renan no Senado. Tudo fica “praticamente na estaca zero”, da feliz definição do jornal espanhol El Pais em manchete. Ou menos de zero, se computada a queda do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, oficializada ontem (19) depois de inumeráveis trompaços do homem que Lula nunca aceitou no governo da afilhada. Nem o PT.

Antes do Judiciário brasileiro (começando pelos ministros do STF) decretar o recesso e entrar de férias, até fevereiro do ano que vem, em meio ao maior furdunço político econômico e institucional de que se tem notícia na história recente do País. Quem faria melhor (ou pior)?

Praticamente, todos os principais sinais indicam que estamos no ocaso de um ano destinado a deixar marcas tão ou mais indeléveis, na vida nacional, quanto o emblemático 1968. “O ano que não terminou” (segundo a percepção original exposta no livro famoso de Zuenir Ventura. O autor, para mim, mais que o bom romancista e narrador, um jornalista referencial, prin cipalmente quando recordo da sua presença, (ao lado de Artur Xexéu) no comando da editoria do Caderno B, na redação do Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro dos anos 70/80. Grife de alcance nacional do melhor jornalismo cultural feito no país na época. Espaço e fonte de registros especiais de algumas das minhas melhores recordações profissionais.

Mal (ou bem?) comparando, para efeito das metáforas possíveis nos testamentos jornalísticos habituais de cada ano, neste quase crepúsculo de 2015, (para muitos "o ano da Lava Jato, do japonês da PF e da justiça de Aldo Moro, no Brasil"). A exemplo de 1968, do livro de Zuenir, este 2015 a caminho do desfecho, teve também a sua antecipada grande e prolongada festa. Aconteceu nas três últimas sessões do Supremo presidido pelo ministro Ricardo Lewandowski, antes do recesso que vai até o mês do próximo carnaval.

Vale a pena recordar. Recordemos então, embora alguns (ou muitos) seguramente considerem esse exercício uma fuga intelectual de articulista pessimista ou enfastiado. Melhor faria, dirão, se estivesse tratando da Operação Vidas Secas (extensão nordestina da Lava Jato), que prendeu o presidente da OAS (já solto) e deu batida em escritórios e casas de executivos de outras grandes empreiteira nacionais, suspeitos de desvios de R$ 200 milhões e outras graves práticas de corrupção nas obras de transposição do São Francisco.

O rio da minha aldeia (nascí na margem baiana, a seis quilômetros de viagem de canoa até a pernambucana cidade de Cabrobó, - do martírio do bispo Flávio Cappio - no chamado “marco zero da transposição"), que sangra a céu aberto e cujas águas definham a olhos vistos, enquanto as obras se prolongam, indefinidamente, mas servem de cenário de engodo há mais de uma década: palanque oficial a cada eleição desde o Governo Lula, e cartão postal de propaganda em sofisticadas e custosas peças de marketing do Governo Dilma.

Pronto, falei! Agora retomemos o fio condutor da memória do princípio deste artigo.

"1968 - o ano que não terminou” começa com o réveillon promovido por Luís e Heloisa Buarque de Holanda, a Helô, na mansão do casal no Rio de Janeiro. Uma festa de arromba, real ou metaforicamente falando. O sonho e a luta comum pelo fim da ditadura militar davam origem, naquele louco happening, a uma inimaginável e a mais improvável aliança política que se pudesse imaginar na época. Com praticamente todas as tonalidades ideológicas e personagens, aparentemente, mais incompatíveis. De Geraldo Vandré a Caetano Veloso, passando por Nara Leão, Millôr Fernandes, Ênio Silveira "e o escambau", para usar a linguagem de Leila Di niz, uma diva revolucionária daquele tempo. Hélio Gáspari, jovem e ferino jornalista que fazia os primeiros ensaios antes de assumir o comando da prestigiosa e demolidora coluna política Informe JB, pontuou: "Depois do Reveillon da Hellô, o Rio nunca mais foi o mesmo". Bingo!

Conta-se que o advogado Rui Soberg, que chegou ao Reveillon com a mulher Gloria Mariani, pediu dois usques para aquecer e lhe puseram na mesa duas garrafas cheinhas até à tampa. Em resumo do livro de Zuenir, escrito para a Revista VEJA, Wilton Fonseca contou: “Nesse momento o jovem advogado pressentiu que a confraternização não terminaria bem. Ele não estava errado. A festa foi um marco: 17 casamentos desfizeram-se naquela noite ou em consequência dela.”

“Excessos etílicos, sexuais e políticos aconteceram em profusão. Houve um momento em que quase todos os presentes apanhavam ou batiam. A casa ficou inteiramente destruída. Às 8 horas da manhã, quando a festa acabou, sobraram 100 garrafas de uísque que foram vendidas para ajudar no conserto dos estragos feitos na mansão”. Wilton Fonseca conclui, naquele resumo de "1968" para a Veja: O "Reveillon" da Helô condensou, como uma metonímia, o país de então, a violência e o descontrole que dominariam o ano de 1968. "O nosso Titanic começava a s ua viagem".

Falta agora fechar estas linhas com uma pergunta que, provavelmente, não quer calar na cuca e na ponta da língua de muita gente: O que tem a ver o louco réveillon carioca de 1968, na mansão de Luís e Helô, com a festa de fim de ano iniciada na tarde de quarta-feira e encerrada na manhã de ontem (18), no palácio maior da Justiça do País, em Brasília, sob o comando de Lewandowiski? Os salamaleques, os tapinhas nas costas, mesmo a título de preâmbulo dos piores e mais traiçoeiros golpes verbais, jurídicos e técnicos (a exemplo do que alguns ministros fizeram com as palavras e o pensamento do político e insigne jurista, ex-presidente da Corte, Paulo Brossard, autor de “O Impeachement”, incorretamente citado, como denuncia sua filha indignada.

Paro aqui e mais não digo, nem sob tortura. O resto, responda quem souber.

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