E o jornalista encaminhou a pergunta para alguém que está na política há várias décadas, que já foi presidente da República e que dessa vez preferiu o anonimato.
Sua resposta, por escrito, foi: “Estamos no meio de uma crise nacional que ninguém sabe como vai acabar”, e acrescentou, enigmático: “A solução mais provável é o inesperado”.
Afirmou ainda: “De qualquer forma, este não é o Brasil que nós sonhamos”.
Como o Brasil é uma democracia, com uma Constituição sólida da qual ninguém pode escapar sem romper as instituições do Estado, essa possível solução inesperada deveria acontecer dentro desses limites constitucionais: o Governo, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). Qualquer solução imprevista deveria vir de um deles para que não possa ser condenada como um golpe.
Tal como a crise está configurada hoje, a solução imprevista para a crise por parte do Governo poderia ser apenas a renúncia da presidenta Dilma Rousseff, já que hoje ninguém acredita nela por mais que já tenha sido alvo da oposição.
E o Congresso? Difícil imaginar uma solução por parte do legislativo que não seja a aprovação do impeachment de Dilma, que deveria ser apresentado por um presidente como Eduardo Cunha, execrado pela opinião pública e por todos os democratas do país. Além disso, essa solução está prevista, não seria inesperada.
Sobraria apenas a possibilidade de que o Supremo Tribunal Federal acabasse surpreendendo com uma solução — essa sim, inesperada —, como ocorreu com o caso Collor, e que aponta com sagacidade neste jornal o meu colega Rodolfo Borges — à época, o STF adequou a lei do impeachment, de 1950, à Constituição de 1988, alterando a forma do julgamento no Congresso.
Seria constitucional porque o STF tem poderes especiais para isso, e seria ao mesmo tempo inesperada e não golpista porque hoje, apesar de todos os problemas e críticas, a mais alta corte do país ainda possui o último halo de credibilidade por parte da opinião pública — 75% dela não confia nos partidos políticos nem no Congresso, e dá à presidenta da República e ao Governo as migalhas de uma das mais baixas aprovações da história da democracia.
Qualquer outra solução passaria, inevitavelmente, pela humilhação de um golpe, seja qual fosse sua cor política. O golpe militar está completamente descartado.
Restaria, e talvez fosse o que preocupava o ex-presidente ao afirmar que a solução para a crise poderia ser inesperada, que na próxima eleição presidencial, seja agora ou em 2018, a sociedade, cansada dos políticos profissionais, apoiasse algum candidato “inesperado” com a incógnita de que pudesse se tratar de algum “aventureiro”, como aconteceu e está acontecendo em alguns países, que em vez de resolver acabasse complicado e agravando a crise política.
De acordo com a maioria dos analistas, a crise começou sendo econômica e estrutural, porque o que está esgotado é o modelo, e acabou se complicando politicamente.
Nessa situação, e já que a crise econômica — seja ela mais grave ou não que a política — não se resolveria sem antes resolver a crise política, o mais provável é que essa tarefa hoje realmente imprevisível e inesperada possa acabar caindo nas mãos do STF, que já foi capaz neste país de resolver positivamente outras crises iguais ou mais difíceis em que a opinião pública era mais exigente e aberta que o Congresso, como em relação ao aborto, as células-tronco, ocasamento entre pessoas do mesmo sexo e agora sobre a liberação das drogas, todos estes temas tabu para o Congresso e o Executivo.
Não é impossível, portanto, que a crise possa realmente acabar tendo um fim imprevisível e cuja solução esteja em grande medida na pressão exercida pela sociedade como um todo sobre os três poderes da Nação.
Tudo isso porque o Brasil dessa crise não é o mesmo país das crises anteriores. É um Brasil mais dividido e exasperado com os poderes públicos, porque o país e a sociedade estão numa luta para sair da apatia e da fictícia unanimidade do passado e começaram a enfrentar os desafios da modernidade. Estamos diante de uma sociedade que não apenas quer ser ouvida, mas também participar na solução da crise cujas consequências econômicas e sociais já começam a penalizar fortemente as famílias.
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