quarta-feira, 8 de abril de 2015

Os protegidos da sociedade

Os governos democráticos no Brasil abusam do direito de governar quando testam o limite do cidadão para a prudência e a temperança
Doutor Joaquim aplica Band-Aid no corpo do atropelado certo de que o paciente sofre, mas não é bem sua dor que interessa. Não pode operá-lo, temeroso da reação de quem provocou o acidente. Ganha tempo inadmissível dando aulas de ficção para enfermeiros de Chicago, pois sabe que a dona do hospital não está em condições de demiti-lo.Os governos democráticos no Brasil abusam do direito de governar quando testam o limite do cidadão para a prudência e a temperança. 
Os apetites pessoais que têm levado nosso país a crises politicas rotineiras e sucessivas não nascem da sociedade. Uma geração de descendentes e vítimas do poder arbitrário está chegando ao fim, quatro gerações depois, vendo a democracia como uma volúpia do poder sobre o desejo das pessoas. Um estado de espírito que vai e volta, um período excelente, que não dura e nunca é o que estamos vivendo.

A morte do idealismo no Brasil e da simplicidade da politica é resultado da proliferação de líderes de comportamentos velados, cujo poder não é o recebido dos eleitores. É a politica exercida como autoexame, mesmo que sob a ótica de pessoas honestas, permitindo a vitória do mundo privado, pessoal, sobre a farsa do universo constitucional que não rege mais nada. Atualmente, dinheiro e vulgaridade dominam tudo, fazendo a política não se submeter ao princípio da verificação e, por isso, seu significado prático não precisa ser demonstrado. Bastam variações do velho modelo do presidencialismo de reeleição para capturar a energia social em direção a cópias de cópias de ideias de escassa autoridade. A relação entre a política e a sociedade não é mais essencial. Virou uma dominação fundada na correlação que seleciona membros para a construção de interesses e a formação de trincheiras de sócios em clubes exclusivos.

No momento em que o Estado quiser encontrar na sociedade uma coletividade essencial à sustentação do nosso país no mundo, ele deixará de ser a farsa deste modelo como o toleramos. E nele a politica será uma atividade simples, de pessoas que pretendem e possuem vocação para representar os outros. Por que hoje, se as coisas não são simples, não é por serem complicadas ou complexas, é por que andam falsas. E neste quadro, cada “novidade desnecessária” exige alguém necessário. E por causa disso no Brasil qualquer coisa só existe se for regulamentada. Nos países viáveis, só se regulamenta o que dá errado. É esta má tradição que confirma que nunca tivemos nenhum governo seguro de que a Constituição é a lei que protege a sociedade contra a falta de limites do governo.

Não deveriam ser efemeridades essas magníficas intuições econômicas e politicas desses 21 anos de presidentes de esquerda que não conseguiram ir além do condicionamento histórico de seus sonhos pessoais. Afinal, o governante aqui descumpre a lei dizendo que é para salvar a democracia. Mas o que sempre se viu é que tudo que é urgente para nossos democratas serve para justificar algum arbítrio e seu método injusto. O modelo político e econômico atual chegou ao fim. Se anda insepulto, é por ser protegido da sociedade.

Paulo Delgado

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