quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Na falta de água, não falta cara de pau


O ilusionismo das palavras não vivifica a terra crestada no fundo das represas
Os governos agora, só agora, vão tomar medidas contra a escassez hídrica, popularmente conhecida como seca. Anuncia-se um festival de obras e consequentemente dinheiro saindo pelo ladrão no superfaturamento. Com a torneira fechada na Petrobras, eis aí uma boa cisterna para se recolher uns milhõezinhos de trocado como compensação. Enquanto não armam os canteiros de obras, se vire o mundo que nenhum deles é Raimundo.

A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, até revelou a grande novidade de se fazer "parcerias republicanas", pomposo nome tirado de cartolas de marketing, para dar água ao povo. Está se vendo pela expressão que os governos não pouparão esforços para engambelar mais uma vez; tirar o deles da reta e mandar que reclamem com São Pedro, esse Cristo da politicagem.

Os governos assim prometem que serão abertas as bicas dos cofres públicos para jorrarem bilhões para os mananciais de sempre: as empreiteiras e bolsos políticos. Até lá, quando Deus quiser e os governos deixarem, haverá enfim água a custo bem mais elevado para o usuário pagar com juros astronômicos. Até lá, quando enfim serão inauguradas as tais obras, o povo que se dane.

Folhear o noticiário é um bom exercício para se livrar da culpa que mídia e governos querem impingir ao usuário, o eterno réu dos crimes dos governos. Ninguém é mais perdulário por ficar uns minutinhos a mais no banho, não escovar os dentes com apenas um copo de água, nunca pensar em recolher a água de chuva, ou não reutilizar a água da máquina de lavar para limpeza geral. As medidas que querem impor ao usuário, como castigo ou punição sem crime, são as que os governos nunca se impuseram por mero desinteresse.

Há 22 anos não se constroem reservatórios no Sudeste, região que produz 23% do PIB brasileiro. Esse novo polígono da seca seria a segunda maior economia da América do Sul só perdendo para o Brasil. Dinheiro nunca faltou, e para roubalheira nem se fala.

Sabiam há 12 anos, segundo especialistas, que haveria um grande período de seca, afetando reservatórios de abastecimento e hidrelétrico. Nada se foi pensado, pois não existe plano B, nenhuma medida tomada, porque racionamento é impopular, tira votos. Deu no que deu.

Nem ao menos fizeram o dever de proteger a população, obrigando as empresas a usarem sistemas de reuso - na quase totalidade não o fazem -, nem que proibido que fosse tirada água dos rios à vontade pelas indústrias. A lista é grande do que poderiam fazer, e não fizeram. Só na Assembleia de Minas (veja aqui) serão arquivados 45 propostas de contenção ao desperdício e conservação da água no Estado, apresentadas nos últimos quatro anos. A maior parte referente à economia a ser feitas por lava-jatos, postos de combustível e estacionamentos, indústrias e até mineradoras brigadas a implantar um sistema de bombeamento que permitiria o retorno para o território mineiro de, no mínimo, 50% do volume de água utilizado no processo de transporte do minério.

Os governos brasileiros, em particular do Sudeste, neste caso, são culpados de omissão, imperícia, negligência e imprudência, que estão no código jurídico. Sem falar na roubalheira para pintarem que estão fazendo o que nunca fizeram nem nunca farão.

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