Seu último relatório, "Da Economia da Ocupação à Economia do Genocídio", submetido ao Conselho de Direitos Humanos da ONU em 3 de julho, marca uma intervenção sísmica. Ele nomeia e implica, sem hesitar, empresas que não apenas permitiram que Israel mantivesse sua guerra e genocídio contra os palestinos, mas também confronta aqueles que permaneceram em silêncio diante desse horror que se desenrola.
"Economia do Genocídio", de Albanese, é muito mais do que um exercício acadêmico ou uma mera declaração moral em um mundo cuja consciência coletiva está sendo brutalmente testada em Gaza. O relatório é significativo por múltiplas razões interligadas. Crucialmente, oferece caminhos práticos para a responsabilização que transcendem a mera retórica diplomática e jurídica. Também apresenta uma nova abordagem ao direito internacional, posicionando-o não como um delicado ato de equilíbrio político, mas como uma ferramenta poderosa para confrontar a cumplicidade em crimes de guerra e expor as profundas falhas dos mecanismos internacionais existentes em Gaza.
Dois contextos vitais são importantes para entender a importância deste relatório, considerado uma acusação contundente do envolvimento corporativo direto, não apenas no genocídio israelense em curso em Gaza, mas no projeto colonial de Israel como um todo.
Primeiro, em fevereiro de 2020, após anos de atraso, o Conselho de Direitos Humanos da ONU (CDHNU) divulgou um banco de dados que listava 112 empresas envolvidas em atividades comerciais em assentamentos israelenses ilegais na Palestina ocupada. O banco de dados expõe diversas gigantes corporativas – incluindo Airbnb, Booking.com, Motorola Solutions, JCB e Expedia – por ajudar Israel a manter sua ocupação militar e o apartheid.
Este evento foi particularmente devastador, considerando o fracasso consistente das Nações Unidas em controlar Israel ou em responsabilizar aqueles que sustentam seus crimes de guerra na Palestina. O banco de dados foi um passo importante que permitiu que as sociedades civis se mobilizassem em torno de um conjunto específico de prioridades, pressionando assim empresas e governos individuais a assumirem posições moralmente orientadas. A eficácia dessa estratégia foi claramente detectada pelas reações exageradas e iradas dos EUA e de Israel. Os EUA afirmaram que se tratava de uma tentativa do "desacreditado" Conselho "de alimentar retaliações econômicas", enquanto Israel a chamou de "capitulação vergonhosa" à pressão.
O genocídio israelense em Gaza, iniciado em 7 de outubro de 2023, no entanto, serviu como um lembrete gritante do fracasso total de todos os mecanismos existentes da ONU em alcançar até mesmo as expectativas mais modestas de alimentar uma população faminta durante um período de genocídio. De forma reveladora, essa foi a mesma conclusão oferecida pelo Secretário-Geral da ONU, António Guterres, que, em setembro de 2024, declarou que o mundo havia "falhado com o povo de Gaza".
Esse fracasso continuou por muitos meses e foi evidenciado pela incapacidade da ONU de sequer administrar a distribuição de ajuda na Faixa de Gaza, confiando a tarefa à chamada Fundação Humanitária de Gaza, um aparato violento administrado por mercenários que matou e feriu milhares de palestinos. A própria Albanese, é claro, já havia chegado a uma conclusão semelhante quando, em novembro de 2023, confrontou a comunidade internacional por "fracasso épico" em interromper a guerra e pôr fim ao "massacre sem sentido de civis inocentes".
O novo relatório de Albanese vai um passo além, desta vez apelando a toda a humanidade para que assuma uma posição moral e confronte aqueles que tornaram o genocídio possível. "Os empreendimentos comerciais que possibilitam e lucram com a obliteração de vidas de pessoas inocentes devem cessar", declara o relatório, exigindo incisivamente que "as entidades corporativas se recusem a ser cúmplices de violações de direitos humanos e crimes internacionais ou serão responsabilizadas".
De acordo com o relatório, as categorias de cumplicidade no genocídio são divididas em fabricantes de armas, empresas de tecnologia, empresas de construção, indústrias extrativas e de serviços, bancos, fundos de pensão, seguradoras, universidades e instituições de caridade.
Entre elas, estão Lockheed Martin, Microsoft, Amazon, Palantir, IBM e até mesmo a gigante dinamarquesa de transporte marítimo Maersk, entre quase 1.000 outras empresas. Foi seu conhecimento tecnológico, maquinário e coleta de dados coletivos que permitiram que Israel matasse, até o momento, mais de 57.000 pessoas e ferisse mais de 134.000 em Gaza, sem falar na manutenção do regime de apartheid na Cisjordânia.
O que o relatório de Albanese tenta fazer não é apenas nomear e envergonhar os parceiros de genocídio de Israel, mas nos dizer, como sociedade civil, que agora temos um quadro de referência abrangente que nos permitirá tomar decisões responsáveis, pressionar e responsabilizar esses gigantes corporativos.
“O genocídio em curso tem sido um empreendimento lucrativo”, escreve Albanese, citando o aumento maciço nos gastos militares de Israel, estimado em 65% entre 2023 e 2024 — chegando a US$ 46,5 bilhões.
O orçamento militar aparentemente infinito de Israel é um estranho fluxo de dinheiro, originalmente fornecido pelo governo dos EUA e depois reciclado por meio de corporações americanas, distribuindo assim a riqueza entre governos, políticos, corporações e inúmeros contratados. À medida que as contas bancárias incham, mais corpos palestinos são empilhados em necrotérios, valas comuns ou espalhados pelas ruas de Jabaliya e Khan Yunis.
Essa loucura precisa acabar e, como a ONU é incapaz de pará-la, governos individuais, organizações da sociedade civil e pessoas comuns devem fazer o trabalho, porque as vidas dos palestinos devem ter um valor muito maior do que os lucros corporativos e a ganância.
Ramzy Baroud

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