Aqui, como lá, não faltam sinais de que estamos mergulhando na treva, enquanto o crime organizado muda de escala, abrangência das suas rentáveis atividades e capacidade de desafiar governos. A eliminação do empresário que lavava dinheiro para o PCC, ao desembarcar —sob escolta— no aeroporto de Guarulhos, "é o crime dizendo que está mais poderoso que o Estado", avalia o ex-policial e deputado estadual paulista Paulo Batista do Reis (PT). Talvez não seja —ainda—, mas o recado parece ser esse.
Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, cerca de 72 facções criminosas agem no país, algumas incidindo de norte a sul, sem falar nas suas alianças internacionais.
Hoje, as atividades do crime já não se restringem ao tráfico de drogas; abarcam também transações ilícitas com madeiras, minerais, combustíveis adulterados e até pessoas –além de lavagem de dinheiro, fraudes financeiras, administração de hotéis e postos de gasolina, comércio de armas, extorsão, segurança privada, aluguel de imóveis, fornecimento de serviços de TV e internet, apostas, golpes online e financiamento clandestino de campanhas políticas.
Um ótimo resumo da questão, dos avanços institucionais já obtidos —importantes, porém insuficientes— e dos desafios pela frente, pode ser lido em "Brasil - Experiências de (in)segurança pública em São Paulo e Rio de Janeiro", parceria da Fundação Fernando Henrique Cardoso e da Escola de Segurança Multidimensional da USP, com patrocínio do Diálogo Interamericano, respeitado think thank de Washington.
O documento tem duas qualidades. A primeira é a de trazer a discussão para a agenda progressista, na qual ela tem crônica dificuldade de se firmar. Assim, o registro de abusos policiais, a discriminação racial, os maus-tratos e a superlotação dos presídios não travam o reconhecimento de que a segurança é demanda forte e legítima da população nem bloqueiam o debate de medidas concretas para a repressão eficaz ao crime.
O segundo mérito consiste em focalizar o que realmente faz falta: a construção de mecanismos de coordenação governamental entre os três níveis da Federação, de forma a aumentar a eficiência da ação pública. Há um caminho a percorrer até que o debate se transforme em ação. Mas disputar a agenda com o populismo de direita já é um começo promissor.
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