Mas quem se der ao trabalho de uma visita ao Google, ou a bulas turísticas, poderá constatar que o QG do Exército, das fotos reducionistas, é uma Vila Militar, situada no Setor Militar Urbano (SMU), entre os bairros Sudoeste e Noroeste, um dos metros quadrados mais valorizados da Capital, com 635 casas destinadas a famílias de militares de diversas patentes e população de 2,5 mil pessoas (Wikipedia).
Reproduz o sistema de quadras de Brasília – QRO (Quadra Residencial dos Oficiais), QRS (dos Sargentos) – e QRG (dos Generais). A enorme área verde, com pomares e pequena fauna, a fez conhecida como Fazendinha entre os militares.
As quadras residenciais indicam a patente dos moradores das casas: Quadra Residencial dos Oficiais (QRO), Quadra Residencial de Sargentos (QRS), Quadra Residencial de Generais (QRG). Esta, com 14 casas de 210 metros cada, sete delas para generais e famílias e sete para oficiais assistentes, todos coronéis.
Possui ainda dois blocos de dois pavimentos com oito apartamentos para oficiais solteiros e dois hotéis de trânsito.
Foi esse ambiente familiar dos militares que serviu por dois meses ao acampamento dos “patriotas”, onde foram arquitetados atos de vandalismo que culminaram com a invasão dos prédios do Congresso, Supremo Tribunal Federal e o Palácio do Planalto.
Ali foram entregues as bombas para o terrorismo explícito, uma delas originalmente prevista para explodir dentro do aeroporto e que acabou plantada fora dele em um caminhão de combustível.
A severíssima vigilância para as famílias militares não detectou nenhuma anormalidade, segundo relatório oficial aceito pelo Superior Tribunal Militar. A proximidade física e ideológica entre moradores e manifestantes, no entanto, põe sob suspeita esse juízo e explica as presenças, algumas vezes registradas, de oficiais e familiares no acampamento.
É a esse fator que se atribui o empenho do comandante do Exército, General Júlio César de Arruda, em impedir prisões em flagrante na área após os atos do dia 8, o que lhe custou o cargo. A barreira de tanques e as ameaças verbais do general à Polícia Militar não terão sido apenas protocolares por ser a área de jurisdição do Exército.
“Você não vai fazer prisões aqui dentro”, disse ao ministro da Justiça, Flávio Dino, dedo em riste, como um chefe de família reagiria em defesa de sua própria casa protegendo de riscos os seus.
Sugeriu mais desespero que disciplina ou excesso de zelo legal. Seria preciso uma triagem seletiva, negligenciada no tempo, que poupasse eventuais moradores do mesmo destino de militantes extremistas.
Tinha suas razões o comandante para impedir o arrastão de segurança. Toda a área é uma extensão das casas e famílias militares, como as superquadras de Brasília funcionam como um quintal de cada domicílio.
O acampamento foi no quintal das famílias militares onde, assim como nos clubes da oficialidade, só entram paisanos avalizados por fardados.
Essa população militar e suas famílias têm atendimento do Hospital Militar de Área de Brasília (HMAB), duas escolas – uma pública (Escola Classe do SMU) e Soldadinho de Chumbo (particular, com creche), com ensino fundamental, o Clube dos Oficiais do Exército (onde civis são admitidos mediante abono de um militar) e o clube de Subtenentes e sargentos do Exército.
O complexo tem dois teatros – o Pedro Calmon, para 1.220 pessoas, com palco de 230 metros, e o Poupex, para 649 pessoas. Seriam excelentes e qualificadas alternativas ao Teatro Nacional, fechado há sete anos, não fosse a pauta de gestão exclusiva do Exército e de dificílimo acesso aos comuns.
É área sob jurisdição militar, mas não de segurança nacional, onde a circulação de público é livre. Mas ninguém passa despercebido ali ou deixa de ser notado pela vigilância permanente, mais severa nas áreas residenciais, principalmente na quadra dos generais, onde cercas, guaritas e sentinelas garantem segurança máxima.
Qualquer morador de Brasília sabe que não transita na área sem dezenas de olhos treinados para detectar suspeitos – e não suspeitos -, em circulação no local. Como não se entra nos jardins de uma casa sem permissão do proprietário.
Não obstante, aos militantes extremistas coube por parte do Exército anfitrião o gentil “entre, a casa é sua”. Às forças de segurança legais, o tratamento reservado aos hostis – “afastem-se daqui”, arma em punho.
O braço forte do slogan do Exército foi levantado contra a Polícia Militar. Já a mão amiga, aos militantes extremistas.
Não há do que reclamar.
João Bosco Rabello
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