Ficamos na defesa correta, mas insuficiente, das cotas para os poucos que terminam o ensino médio, sem olhar para a imensa perda dos que ficam para trás, sem educação de base com qualidade suficiente para se aventurar no vestibular, mesmo com a possibilidade de cotas. Defendemos corretamente que as cotas existam para reduzir o impacto da educação de base desigual, mas não nos mobilizamos para que ela seja a mesma para ricos e pobres, nem acreditamos que isto seja possível antes de 50 anos.
Acertamos ao nos opor ao retrocesso de limitar acesso às universidades federais apenas aos que podem pagar, mas não nos preocupamos com aqueles que nem perto chegarão dela, por serem analfabetos para as exigências do vestibular. Tampouco adotamos a honestidade intelectual de dizer que a universidade já é paga pela sociedade, não existe gratuidade plena, a pergunta devia ser “quem paga” e “quem se beneficia”, e como fazer a universidade servir aos interesses públicos e da nação. Estamos certos em não querer que a universidade seja apenas para quem possa pagar, mas estamos errados ao aceitar a manutenção de um sistema escolar com escolas de qualidade apenas para quem pode pagar caro.
Não lutamos pela gratuidade das escolas de educação de base com qualidade. Defendemos que as universidades sejam grátis, sem defender a gratuidade das escolas de ensino médio com qualidade. Defendemos que alguns poucos pobres possam entrar na universidade, mas não que todos eles concluam o ensino médio em escola com a mesma qualidade dos filhos dos ricos. Possivelmente, nem se acredita que isto seja necessário e possível.
Corretamente defendemos o direito das crianças de famílias ricas e de classe média frequentarem escola para aprenderem com outras crianças, mas pouco fazemos para que as crianças pobres tenham escola com a qualidade que os filhos destas famílias terão em casa. Nem nos preocupamos em saber onde estamos errando ao ponto dos pais desejarem tirar os filhos da escola.
Reagimos ao absurdo de ocupar as escolas com militares, mas não reconhecemos os erros que cometemos ao tolerar a indisciplina, devido a erros pedagógicos, dominação sindical, desprezo à educação por parte de governos e educadores. Não apresentamos, não lutamos nem praticamos métodos que deixem a escola funcionar ordeira e respeitosamente, sem necessidade de ocupação militar.
Ao observar este debate, percebemos que no Brasil o progressista é conservador: defende conceitos arraigados, interesses sindicais e eleitorais, e direitos adquiridos pelos que já têm acesso à educação, ignorando os excluídos que vão ficando abandonados.
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