Em 2011, visitei Talín, a capital da Estônia, para apresentar a tradução de um dos meus romances. Na época, cerca de um terço da população era de origem russa. Muitos dos russos estonianos, porém, não possuíam cidadania nenhuma — e nenhum direito.
Os estonianos étnicos acusavam os compatriotas russos, que viviam em condições terríveis, de recusarem uma integração efetiva: “Quer um exemplo? Eles se negam a aprender a nossa língua”. Como rapidamente percebi, aquele era um tema incômodo para todos.
Na Letônia, onde os russos chegaram a constituir quase 40% da população, o conflito entre as duas comunidades é ainda mais aceso.
Consigo compreender o melancólico sentimento de orfandade dos descendentes dos russos nas antigas repúblicas soviéticas. Na mãe-pátria, uma boa parte dos cidadãos também tem dificuldade em aceitar o colapso da URSS. Os russos podem não ter boas recordações do comunismo, mas sofrem com saudades do império, e do tempo em que eram vistos como uma superpotência, lado a lado com os Estados Unidos.
Os estonianos étnicos acusavam os compatriotas russos, que viviam em condições terríveis, de recusarem uma integração efetiva: “Quer um exemplo? Eles se negam a aprender a nossa língua”. Como rapidamente percebi, aquele era um tema incômodo para todos.
Na Letônia, onde os russos chegaram a constituir quase 40% da população, o conflito entre as duas comunidades é ainda mais aceso.
Consigo compreender o melancólico sentimento de orfandade dos descendentes dos russos nas antigas repúblicas soviéticas. Na mãe-pátria, uma boa parte dos cidadãos também tem dificuldade em aceitar o colapso da URSS. Os russos podem não ter boas recordações do comunismo, mas sofrem com saudades do império, e do tempo em que eram vistos como uma superpotência, lado a lado com os Estados Unidos.
Ironicamente, como ficou claro enquanto tudo ruía, a URSS era um gigante com pés de barro. O equívoco do seu poder foi sendo alimentado pelos próprios americanos, aos quais convinha a imagem de uma União Soviética forte e perigosa, como forma de justificar o crescimento do arsenal nuclear, e o “combate pela civilização ocidental”. Se não tens um inimigo poderoso, inventa-o. Afinal, a grandeza de um país se mede pela dimensão dos seus inimigos.
Tendo tudo isto em conta, o ataque em curso contra a Ucrânia não parece tão surpreendente. Vladimir Putin nunca hesitou em usar o nacionalismo e a nostalgia imperial (um subproduto do primeiro) para reforçar o seu poder. Talvez acredite na legitimidade russa em proteger os órfãos do império. É até possível que acredite no disparate que disse, na quinta-feira, para justificar a invasão: que a Ucrânia é terra ancestral russa. Acredite ou não, muitos dos seus compatriotas acreditam. Milhões de russos, inclusive alguns que sempre o criticaram, irão agora unir-se à sua volta.
O nacionalismo é uma doença infantil da Humanidade — talvez a mais perversa. Em pleno século XXI, depois de termos criado condições extraordinárias para a partilha de conhecimentos e de manifestações culturais, já não deveria haver espaço para pensamentos nacionalistas e outros atavismos ideológicos.
Vladimir Putin, na Rússia, ou Jair Bolsonaro, no Brasil, são excreções de um passado que nos envergonha a todos. Não pertencem a este tempo. A questão é: como fazê-los regressar ao passado a que pertencem?
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