Somente a Hungria e a África do Sul aparecem com índices de abandono da sociedade por parte de seus governantes parecidos ao Brasil. Segundo os responsáveis pela pesquisa, hoje quase todos os países do mundo revelam um sentimento de que os governantes trabalham somente para os mais poderosos e em proveito próprio, mas em nenhum país essa crítica aos governantes aparece tão forte como no Brasil. Os sentimentos da maioria da população são de “decepção e insegurança”.
74% dos brasileiros apelam, como remédio, à chegada de um líder forte que tire o país das mãos dos ricos e poderosos. De acordo com a pesquisa, esse líder deve ser capaz de “quebrar as regras e deve ser alguém de fora das instituições”. Isso indica, principalmente no Brasil, uma certa nostalgia pelos tempos da ditadura que hoje são vistos pelos mais desiludidos com a política como tempos de “ordem e sem corrupção”, algo que já sabemos que é falso.
Desse modo, se explica a alma do bolsonarismo alimentado hoje por seu líder com seus instintos de quebrar as instituições democráticas, de impor o autoritarismo e do uso da mentira e das fake news que, no melhor estilo do nazismo, repetidas mil vezes acabam parecendo verdade. O último exemplo de Bolsonaro é sua obstinação em afirmar que as urnas eletrônicas não são confiáveis nas eleições, sem nenhum fundamento já que são usadas e consideradas como as mais seguras na maior parte dos países civilizados e democráticos.
Por isso parece cada dia mais claro que a ideologia bolsonarista não só é conservadora e de extrema direita liberal, como tem em suas bases ligações com o neonazismo, como revela a antropóloga Adriana Dias, uma das maiores pesquisadoras do mundo sobre nazismo. Ao site The Intercept, a pesquisadora contou que encontrou referências a Bolsonaro em sites neonazistas datadas de 18 anos atrás, quando ele era ainda apenas um obscuro deputado. Isso é uma confirmação clara de que a parte da base bolsonarista tem ligações neonazistas.
Não ajudou o vergonhosa foto de dias atrás em que o presidente Bolsonaro com a deputada Beatriz von Storck, da extrema direita alemã, neta do ministro das Finanças de Hitler, que tanto peso teve no genocídio judeu, o mais bárbaro e emblemático da história. Na foto ela está abraçada ao presidente Bolsonaro que mostra com um largo sorriso uma felicidade sem dissimulação e que, diante das críticas, se sentiu surpreso por alguém estranhar seu encontro com a líder nazista.
Assim se explicam as falas no Congresso, anos atrás, quando defendia a ditadura militar e elogiava os torturadores. E se explica sua atitude diante da pandemia da covid-19, que deixou 556.000 vítimas no Brasil, que lhe rendem a alcunha de genocida. Isso porque sua atitude diante da pandemia não foi só negacionista. Foi algo pior que deverá ser melhor estudado.
Sua atitude leva a sombra do espírito de extermínio dos mais fracos e dos que não são úteis ao trabalho como os doentes graves e os idosos. Nenhum problema em que morram todos os que não são úteis ao trabalho, o que economizaria o gasto em aposentadorias. Pelo contrário, defendeu com certo orgulho que os atletas e fortes como ele sequer seriam infectados. Toda sua atitude, na pandemia e até agora com a luta contra as vacinas, reflete os ecos de uma ideologia que desprezava os diferentes.
Não é, portanto, estranho que os que estão na luta pela defesa dos indígenas sejam hoje perseguidos pelo bolsonarismo raiz. Esses indígenas que eram os donos destas terras até serem colonizados pelos europeus são vistos hoje pelo bolsonarismo como inúteis e até como um estorvo que o impedem de tomar a Amazônia para transformá-la em um campo que pode ser explorado pelo capitalismo selvagem.
Toda essa política de Bolsonaro, que já está provado que não sabe e não quer governar usando os cânones da democracia, aparece cada dia mais evidente. Seu sonho é quebrar as instituições democráticas para poder se perpetuar no poder absoluto no melhor exemplo dos piores ditadores e é isso o que hoje sente a grande maioria da sociedade brasileira e causa preocupação mundial, essa sensação de abandono, de insegurança, de desesperança e de medo de uma quebra não só econômica, e sim de valores.
70% do Brasil hoje tem a consciência de estar órfão de liderança democrática, sem esperanças no futuro, cada vez mais devorado pela crise econômica e de valores, com filas de famílias disputando restos de comida que os mercados jogam no lixo porque sofrem de fome e desemprego.
O Brasil hoje sabe que a educação está em crise, como a cultura e a segurança pública. Sabem muito bem os que são diferentes e cada vez mais perseguidos e, principalmente, não enxergam uma saída digna e esperançosa no horizonte. Isso é o que arrasta os brasileiros a um sentimento de decepção, às vezes de desprezo e até de hostilidade aos seus governantes incapazes de apresentar a eles uma alternativa que defenda os valores da democracia capaz de abraçar todas as categorias sociais, oferecendo as oportunidades para melhorar na vida e poder sonhar com um futuro digno para eles e seus filhos.
O que o estudo do Ipsos, que coloca o Brasil como o país do mundo com maior grau de desilusão ao presente e ao futuro e com o perigo de apostar em governos autoritários e nazifascistas, nos revela é como é possível que diante do crescimento da política nefasta do bolsonarismo nesse país, as instituições democráticas apareçam passivas e até indiferentes. Não se explica por que o Congresso e a Justiça parecem paralisados quando não indiferentes diante do crescimento evidente de uma involução autoritária e destrutiva dos valores civilizatórios, que ninguém sabe para aonde podem levar o país.
Há momentos para um povo que, como a história nos ensina, são definitivos para determinar se escolhe-se o caminho da convivência pacífica e construtiva, da defesa da vida e dos valores que permitem que todos desfrutem dos direitos libertadores, não só os privilegiados, ou fica-se de olhos fechados. São momentos sem volta se não existir a capacidade de usar a tempo o bisturi para extirpar o mal do neonazismo que parece querer reviver novamente. Uma política de destruição e culto da mentira que ameaça não só a convivência pacífica como tenta extirpar o que há de melhor e mais nobre no ser humano para arrastá-lo aos tempos sombrios da barbárie que a humanidade já experimentou e que parece querer erguer novamente sua bandeira de morte e destruição.
Que o Brasil apareça na pesquisa na liderança desse declínio civilizatório e do medo do presente e do futuro é algo que deveria fazer refletir os que ainda têm em suas mãos a possibilidade de impedir que o barco da esperança possa naufragar sem possibilidade de retorno.
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