quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

Bolsonaro oficializou o faroeste

Há anos fui abraçar um amigo, amado por muitos, e senti sob o casaco algo sólido na sua cintura. Uma arma, claro, e recolhi a mão. Ele não percebeu minha repulsa, mas fiquei triste. Por que alguém iria armado a um encontro de pessoas que se estimavam? Temia ser atacado, precisaria se defender e, talvez, reagir atirando? O que teria feito para isso? E só então o travo se dissipou. O objeto era um celular.

Eduardo Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro, deixou-se fotografar há dias com pai e irmãos no gabinete presidencial com um trabuco no cinto. O Planalto tem segurança própria, donde ninguém deveria sentir-se em perigo. Mas, conhecendo bem o governo de que faz parte, Eduardo Bolsonaro está atento. Com a quantidade de armas de fogo em mãos de particulares no Distrito Federal, nem o palácio é seguro. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o registro de armas no DF cresceu 539% em 2019, e um em cada 11 de seus cidadãos anda armado —sem contar o mercado ilegal.



Para sorte dos Bolsonaros, muitos dos brasileiros armados são seus amigos. Como a polícia acaba de descobrir, Ronnie Lessa, acusado de assassinar Marielle Franco e ex-vizinho do presidente num condomínio na Barra, comprava ferramentas pela internet para a montagem de fuzis de guerra. Imagino que, em seus churrascos, eles trocassem dicas sobre balas dum dum e silenciadores.

Bolsonaro oficializou o faroeste. Um decreto seu dificultou o rastreamento das armas em circulação. Com isso, o armamento apreendido diminuiu e o que volta para o crime aumentou. Qualquer um compra agora 300 munições por mês —eram 50 por ano até há pouco. Pessoas apontam armas no nariz uns dos outros e bandos praticam assaltos de cinema. Aumentou o feminicídio. Bandidos e policiais continuam matando e morrendo e, cada vez mais, sobram balas para as crianças.

Eduardo Bolsonaro tem razão em andar prevenido.

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