A República fez aniversário. Cento e trinta e um anos e ainda não tomou juízo. Começou instável, pela espada do Deodoro, e continua aí na corda bamba.
Essas frases foram escritas por Otto Lara Resende, em 1991. O diagnóstico continua certeiro. Só atualizei a contagem dos anos.
Em 15 de novembro de 1889, o país passou a ser governado por um marechal. Hoje está nas mãos de um capitão. Não foi só nisso que regredimos.
Na semana das eleições municipais, os holofotes se deslocaram dos candidatos para o comandante do Exército. O general Edson Pujol afirmou que as Forças Armadas “são instituições de Estado”. A obviedade não deveria chamar a atenção numa democracia.
“Não somos instituição de governo, não temos partido. Nosso partido é o Brasil”, disse o general. Ele cometeu um ato falho. A última frase estampava a camiseta de Jair Bolsonaro quando ele foi esfaqueado em Juiz de Fora.
Na sexta, o vice-presidente Hamilton Mourão endossou as palavras de Pujol. “Política não pode entrar dentro do quartel. Se entra política pela porta da frente, a disciplina e a hierarquia saem pelos fundos”, afirmou.
O general não costumava pensar assim. Antes de passar à reserva, ele foi punido duas vezes por se meter na política. Em 2015, Mourão afirmou que o impeachment de Dilma Rousseff significaria “o descarte da incompetência, má gestão e corrupção”. Em 2017, disse que Michel Temer promovia um “balcão de negócios” para não cair.
Nas duas ocasiões, o general sabia o que estava fazendo. Ao atacar presidentes, ele quebrou a hierarquia para se projetar na política. Deu certo. Em 2018, seria convidado a integrar a chapa de Bolsonaro.
A declaração de Pujol também não combina com a atuação de seu antecessor. Às vésperas da eleição, o general Eduardo Villas Bôas pressionou o Supremo Tribunal Federal a negar um habeas corpus ao ex-presidente Lula.
A interferência da caserna no Judiciário empolgou o então candidato Bolsonaro. “Estamos juntos, general”, tuitou o capitão, que seria o maior beneficiário do julgamento.
Ao vestir a faixa, o presidente premiou o militar com um cargo no Planalto. A filha dele está pendurada no gabinete da ministra Damares Alves.
No início do mês, surgiram novas informações sobre a atuação política de Villas Bôas. Nos meses que antecederam o impeachment de Dilma, ele teve “vários encontros” com o então vice-presidente Michel Temer, segundo relato do professor Denis Rosenfield.
O comandante do Exército reclamava da Comissão Nacional da Verdade, que investigou crimes da ditadura. Na mesma época, o senador Romero Jucá foi gravado dizendo que os chefes militares prometeram “garantir” a derrubada da presidente.
Ao assumir a cadeira de Dilma, Temer deu ministérios a dois generais ligados a Villas Bôas. Um deles assumiu a pasta da Defesa, que só havia sido ocupada por civis.
Começava ali o retorno dos militares ao centro do poder. Com a vitória de Bolsonaro, os generais pensaram que voltariam a mandar no país. Agora alguns se dizem arrependidos, mas não o suficiente para deixarem os cargos.
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