Toda semana uma coleção de fatos é adicionada a outros, anteriores, mostrando a marcha que o país perigosamente empreende rumo ao abismo institucional. Muitos colaboram por má-fé ou ambição pessoal, alguns, porque olham para um ato específico e julgam erroneamente que ele não se soma a todos os demais que enfraquecem as instituições. Há os que ajudam porque andam distraídos quando a Pátria exige cuidados.
Pode-se começar a lista de qualquer ponto. Em cada um deles há sinais de que colaboradores, conscientes ou involuntários, ajudam o projeto autoritário. Na economia, quem entregou a bandeira liberal para esconder o voluntarismo autoritário do presidente colaborou muito. Mesmo quem não se considera liberal pode ver que os clichês eram úteis, mas falsos. O “tirar o Estado do cangote do empresário” ou o “mais Brasil e menos Brasília” eram estelionatos, como tudo o mais. Diariamente vemos o aumento de Brasília subjugando o país. Em nome do que trabalham os economistas do governo? Já não há projeto, não há consistência, não há autonomia mínima. Estão todos engajados na campanha de 2022. Nada entregaram, a não ser a si mesmos. E para um governante de maus propósitos.
Aceitam, os gestores do orçamento, tirar dinheiro da educação num ano de emergência para jogar em asfalto, porque crianças e jovens aprendendo melhor não dão uma inauguração, mas um trecho qualquer de estrada serve de palanque ao presidente. Aceitam os colaboradores do Ministério da Economia estar em minoria numa Junta Orçamentária de generais. Desistem de qualquer amor próprio em nome não se sabe do quê. Um economista que passou pelo mercado financeiro entende quando já perdeu. Se fica na posição é porque acha natural o abuso.
A demolição da democracia tem tido muita ajuda da Procuradoria-Geral da República (PGR). Augusto Aras sabe o que faz. E não está sozinho. Remanescente de um tempo pré-constitucional, no qual era possível somar a advocacia com a procuradoria e servir a dois senhores, Aras tem pouco a ver com o atual Ministério Público construído como defesa dos interesses coletivos após 1988. Mas tem tido ajuda no seu trabalho incessante de transposição da PGR para a AGU.
O Supremo Tribunal Federal instalou barricadas importantes contra o avanço do autoritarismo. Por isso, o presidente foi para a rua com manifestantes pedindo o seu fechamento. E o fez impunemente. Os investigados são os que financiaram os atos que pediam a morte da democracia. Quem os incentivou a pedir poderes ditatoriais para si, esse está protegido pelo manto da Presidência. O STF tem que avaliar bem seus atos neste momento da República. Eles são supremos, contra eles a quem recorrer? Todos sabem naquele egrégio tribunal que o interrogatório de um investigado, se for sério, não pode ser por escrito, porque com esse conforto o trabalho de redação será entregue a um auxiliar. Todos sabem que o capítulo em que está a prerrogativa do artigo 221 do CPP tem como título “Das Testemunhas”. O capítulo “Do interrogatório do acusado” é outro. O presidente não pode ser testemunha da sua própria investigação. Um erro não faz um direito de isonomia. O espírito da lei repousa no voto de Celso de Mello. Com que artifícios jurídicos se tentará escapar do que está escrito?
O que mais a Justiça fará para não punir os que em gabinetes com inúmeras rachadinhas drenaram o dinheiro coletivo para os bolsos da primeira família e até da ex-família? Com que tapumes serão protegidos? Com quantas liminares será cassado o direito da imprensa de informar?
Um projeto autoritário se constrói com muitos erros e omissões. O Brasil neste momento triste de 135 mil mortos e um presidente que ri do sofrimento coletivo está no caminho da perdição da sua maior conquista. A vitória que Doutor Ulysses, com ódio e nojo à ditadura, exibiu ao país, triunfante, naquele dia de não se esquecer.
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