O alvo específico da crítica do ministro do STF foi a militarização do Ministério da Saúde, há dois meses sem titular e comandado interinamente pelo general da ativa Eduardo Pazuello, que para lá levou mais 28 militares. Pazuello não tem formação médica, assim como a maior parte de seus auxiliares fardados. Durante seu interinato, as mortes ultrapassaram o nível de 1 mil por dia e se mantêm nesse patamar.
Pazuello, especializado em logística, foi enfiado goela abaixo do então ministro Nelson Teich, que chegou, viu o ambiente e saiu correndo do pandemônio do ministério em menos de um mês. Bolsonaro disse em junho que Pazuello faz um trabalho “excepcional” e justificou seu ingresso ao lado de Teich: “um médico dificilmente é gestor”. Com igual razão, um gestor não é um médico e militares cumprem ordens. As ordens vieram de cima, do presidente da República e condenaram o ministério a se tornar irrelevante quando ele era mais necessário no combate à pandemia. As ordens foram cumpridas à risca.
Pazuello estreou no lugar de Teich propondo nova forma de contabilizar vítimas e infectados, suspendendo a divulgação de relatórios diários, regular até então. Atendeu às manias do chefe e criou um novo protocolo recomendando o uso da cloroquina desde a fase inicial da infecção, quando não há qualquer comprovação científica da eficácia do remédio, mas várias sobre seus males.
Bolsonaro se opôs ao distanciamento social, ao trabalho de coordenação necessário executado por Luiz Mandetta e há pouco usou sua caneta para vetar que o uso de máscara seja obrigatório no comércio, igrejas etc. Pazuello é um aplicado cumpridor desta estratégia, que levou a Saúde à nulidade durante a maior crise sanitária em décadas e eliminou qualquer expectativa de que possa ter o mínimo papel positivo durante a pandemia. O presidente é o artífice e responsável pelo desastre.
De desastre, desprezo pela vida humana e incompetência até o genocídio, porém, há um oceano. Mas Gilmar, a rigor, não colocou o Exército como sujeito e autor do inexistente genocídio, mas advertiu-o a não ser um coadjuvante de uma política aberrante e mortífera. Com a cautela que não teve na primeira vez, Gilmar afirmou em nota na terça que refutava “a decisão de se recrutarem militares para a formulação e execução de uma política de saúde que não tem se mostrado eficaz para evitar a morte de milhares de brasileiros”.
Bolsonaro não promoveu a revoada de militares da reserva e da ativa para seu governo à toa. O presidente radicaliza seus ataques às instituições sugerindo que têm o apoio fardado. Como comandante-em-chefe das Forças Armadas, não pode ser desobedecido ou contestado. O ministro da Defesa e os comandantes militares não se distanciaram dessa armadilha, assim como não ficaram quietos sobre as barbaridades políticas cometidas pelo presidente. Mas estão vigilantes e crispados exatamente diante de críticas ao comportamento provocador de Bolsonaro. O ministro da Defesa sobrevoou uma manifestação contra a democracia ao lado do presidente.
Há este recado implícito na forma errada com que Mendes usou para apelar aos militares. Eles estão se associando demais aos ataques contra a democracia e demais atos destrutivos de Bolsonaro. Por isso, poderão colher os frutos amargos com a depreciação de seu prestígio junto ao público, que demorou décadas para ser construído. As surpresas que a Justiça pode trazer nos casos Queiroz, milícias, rachadinhas e Flavio Bolsonaro, desaconselham vivamente a identificação com o governo.
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