quinta-feira, 7 de maio de 2020

Eu, mutilado capilar

Os barbeiros me humilham cobrando meia tarifa. Faz uns vinte anos que o espelho delatou os primeiros clarões debaixo da melena frondosa. Hoje o luminoso reflexo de minha calva em vitrines e janelas e janelinhas me provoca estremecimentos de horror.

Cada fio de cabelo que perco, cada um dos últimos cabelos, é um companheiro que tomba, e que antes de tombar teve nome ou pelo menos número.

A frase de um amigo piedoso me consola:

— Se o cabelo fosse importante, estaria dentro da cabeça, e não fora.

Também me consolo comprovando que em todos esses anos caíram muitos de meus cabelos mas nenhuma de minhas idéias, o que acaba sendo uma alegria quando a gente pensa em todos esses arrependidos que andam por ai.

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