terça-feira, 19 de junho de 2018

A agenda para o Brasil começa pela reconstrução da liderança política


Entre gols, surpresas e empates, no ritmo da Copa do Mundo, atendo a duas jornalistas. Pretendem fazer uma matéria especial, para estes dias modorrentos em que a política é eclipsada pelo futebol. Dizem que conversarão com alguns “especialistas” a respeito de uma agenda para o Brasil. Muito bem. Mas, “especialistas”… Na política, quase tudo é, ao mesmo tempo, vulgar e especial. E, no fim, como no futebol, todo mundo se sente especialista em política. Agenda, ora, cada um terá a sua.

Bem, vamos em frente. “Qual a agenda da eleição; quais os cinco pontos fundamentais que a eleição tem que discutir?” Por exemplo: “Saúde, Educação, Segurança, Ajuste Fiscal, Reforma Tributária.?” Elas já vem com sua pauta. Como disse, todo mundo tem a sua. Escalação da Seleção também.


Eu que só sei que nada sei; que, como Riobaldo, apenas desconfio, boto-me a pensar em muita coisa, nessa condição, como dizem, de “especialista”. Os pontos que levantam são mais ou menos óbvios e estão na boca da mídia há muito tempo. Os três primeiros são políticas públicas clássicas, que entraram em colapso no Brasil — se é que algum dia não estiveram em colapso. Os dois últimos dizem respeito à bancarrota em que se transformou as contas públicas no Brasil. Fazem sentido.

Mas, por que esses tema não vingam se, além de evidentes, são necessários? Por que o Brasil tem essa enorme dificuldade de dar conta do básico, o que nem deveria estar em discussão? Haveria algo mais básico e primário, que antecede a esses temas, e que estaria fora do radar das jornalistas e dos “especialistas”?

Por mais emergencial, creio que essa pauta não é fundante nem estruturante da agenda do Brasil. Melhor dizendo, esses temas são fundamentais, mas exigem pré-requisitos que parecem desconsiderados. Não, não falarei da tal “reforma política a mãe de todas as reformas”, clichê que muita gente repete, atribuindo a frase a Ulysses Guimarães. Também a reforma política é tão básica e evidente que, do mesmo modo, valeria perguntar por que, afinal, não se efetiva.

O primeiro problema, penso, mora na crença que indica ser a economia o fator mais determinante da política, e não o contrário. Um certo economicismo, raciocínio mecânico que afeta igualmente a liberais e a marxistas: o primado da economia.

É verdade, a economia influencia as relações políticas; pode favorecer ou dificultar diálogos, pactos, disputas, conflitos. A luta pela sobrevivência ou pelo poder econômico é básica. Atribuem a Marx a frase “primeiro a barriga”. Faz sentido. A fome é visceral, a tentativa de saciá-la é um instinto. Mas, e quando a economia está em crise, o qual a sua causa? Acreditar em razões meramente econômicas parece ser de um simplismo atroz.

Esse erro tem sido insistentemente repetido. O exemplo mais recente pode ser justamente recolhido da experiência — mal sucedida — do governo Michel Temer.

Pois, muita gente do mercado financeiro e do governo acreditou que a pauta econômica seria facilmente implantada, por mera questão de “vontade política” — mais uma dessas sandices repetidas à esquerda e à direita. Do desejo e, claro, da inevitabilidade econômica, despertariam a racionalidade e, daí, brotariam as reformas. Os investimentos jorrariam e, com isso, o crescimento econômico, o bem-estar social e a solução dos problemas políticos. A Lava Jato morta e enterrada; os políticos comprometidos, livre — com Supremo, com tudo… Só que não.

Não foi assim simplesmente porque não é assim. O que induz reformas é, antes de tudo, um sistema político funcional e bem sincronizado. E, para isto, liderança política é condição sem a qual não se conduz processos econômicos necessários, imprescindíveis.

Mas, liderança política é palavra gasta. Vulgariza-se o tema, confundido seus termos. Pensa-se liderança como a ação de um só; de um demiurgo, salvador da pátria, super-herói. E esses assim, que arrogam desse poder são pedra de pirita, ouro de tolo. E são vários os que assim se apresentam nessa quadra histórica porque passa o país.

A liderança moderna não é e nem pode ser unipessoal. É desafio de gerações. A liderança política moderna e democrática é resultado de sinergia, do acúmulo de ações e vontades coletivas, um processo social.

Escrevi inúmeras vezes sobre isto e reconheço ser repetitivo. Mas, tem sido como pregar no deserto. O Brasil, ou parte dele, continua pensando na agenda econômica, olhando para a política com indiferença olímpica, sem saber que a prioridade das prioridades do país será reconstruir a liderança política.

Decerto, isto não se fará do dia para noite, entre a eleição e o próximo governo e nem se completará ao longo de um só mandato. Mas, é preciso iniciar o processo; olhar nos olhos dessa medusa, sem medo de virar estátua de pedra.

O primeiro passo será conhecer o Estado-Maior de cada candidato; os homens e mulheres que o cercam; a capacidade política, a qualidade de articulação de cada membro desse conjunto. Sua disposição para agregar novas contribuições, abrir espaço para novas lideranças. Valores e princípios que os norteiam, além da sagacidade com que se movimentam no mundo dos leões e das raposas.

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