O tempo é um eterno desafio do viver. O passado nem sempre é passado. Insisto e repito William Faulkner: - O passado nunca morre. Sequer é passado. Em A cor púrpura, um personagem, sentindo a opressão das circunstâncias, traduz a sua inquietação: - Quanto mais as coisas mudam, mais parecem iguais. E o futuro? O que é o futuro? Uma grave e duvidosa interrogação. Nada mais. Sabe-se lá se o futuro se faz presente. Há aqueles que vivem para futuro. Adoram o futuro. Amam para o futuro. Odeiam para o futuro. Poupam para o futuro. Preparam-se para viver o futuro. Casam para o futuro. Ou mesmo não casam. Têm filhos para o futuro. Constroem riquezas para o futuro. E morrem antes do futuro. Uma pena!
Ou somos esquecidos, ou somos criticados de forma ácida ou irônica. Nem o Bom Samaritano escapou dessa. Margaret Thatcher, a Dama de Ferro, de péssima lembrança para o trabalhador da Inglaterra, no tempo da imposição dos insanos postulados neoliberais, para justificar o poder do capitalismo, declarou, com a ironia britânica, que "ninguém se lembraria do Bom Samaritano, se ele tivesse apenas boas intenções. Ele tinha dinheiro também". Cristo não teve a intenção, ao criar a parábola do Bom Samaritano, em demonstrar as suas virtudes capitalistas, de pagar a conta, mas ressaltar o servir, no sentido de pôr-se ao atendimento das carências do próximo. De todos, quem é o próximo? Eis a grande e necessária indagação, cujas respostas não decorrem de meras manifestações festivas de um fazer de páginas de jornais, revistas ou de marketing televisivo.
Mas repito: embora não tão velho assim, sou do tempo em que ralhar era chamar a atenção, dar bronca. De uma época em que as mulheres gozavam de grandes privilégios, e infelizmente não eram tão iguais aos homens. Estes sempre tiveram a mania de ser mais iguais, no dizer Orwell. As mulheres tinham tantos privilégios que, em qualquer transporte coletivo, ao subir esse ente bíblico, nascido da costela de Adão, o homem, obsequioso, levantava para dar-lhe a primazia do lugar. Parece-me que hoje a mulher é quem presta essa homenagem ao homem, que, de sexo forte, está cada vez ficando mais fragilizado nesse embate com o sexo oposto, que nem mais é sexo, é gênero.
Sou do tempo da cristaleira, do petisqueiro e da penteadeira. Ainda do tempo em que se mandava roupa para a tinturaria. Sou da época do luto, em que se prestavam sentimentos de homenagem aos familiares que sucumbiam sem a possibilidade de viver o futuro. Sou de um tempo em que se almoçava e jantava, e a dieta era um bom prato de arroz e um apetitoso e fumegante cozido, condimentado de mandioca. Sou de um tempo em que os bons ternos eram feitos por um bom alfaiate, e os sapatos pelos sapateiros, que ainda os eternizavam com as meias-solas. Vocês, nessa alusão passadista, me perguntariam: nesse tempo, tudo era bom? Não. Não é bem assim. O alfaiate nem sempre fazia uma boa roupa; nem o sapateiro fazia sempre um bom sapato. Não havia a bendita televisão, não havia a internet; também não havia celular, o telefone era o fixo, sentava-se à porta, havia vizinhos, mas havia muita fofoca. Hoje cada é um por si e, dependendo do dízimo, Deus por quem paga. Continua-se a fazer filhos com as mesmas práticas e métodos, desde a distante época que o homem é homem e a mulher é mulher, com algumas variações in vitro, é verdade, não prazerosa. Mas são os novos tempos. Nada morre para sempre! A vida começa todos os dias, nunca deixando de ser inovação e repetição.
Nenhum comentário:
Postar um comentário