O primeiro é sobre a qualidade dos dados. As informações estatísticas dos estados da Federação foram classificadas em três níveis. No primeiro estão justamente os estados que apresentam taxas mais altas ou aumentos de crimes mais preocupantes (PA, MG, PR, SC, CE, PB, AL, AM, RN, PE, RJ, PI, ES). No segundo grupo estão alguns dos estados mais ricos e poderosos do país (RS, MT, GO, SP) ou os que mais contestam os dados apresentados (SE, AC, MA) por não concordarem com o tratamento dado às estatísticas fornecidas. SP, o mais rico de todos, está no segundo grupo. O que exatamente significa essa menor qualidade dos dados?
Quando observamos ocorrências analisadas, a pulga atrás da orelha fica ainda mais alvoroçada. Nos estados em que as mortes violentas cresceram pouco, estacionaram ou diminuíram aparecem assustadores números de desaparecidos, uma classificação misteriosa. Foram ao menos 693.076 registros de pessoas desaparecidas em dez anos no país, um terço dos quais em SP (242.568), que, no entanto, exibe a taxa mais baixa de homicídios. O segundo colocado, RS, registrou 91.469; e o terceiro, aquele estado que sempre está em foco como o estado em que o crime está “fora de controle”, com 56.365 sumidos. As taxas por cem mil habitantes confirmam que, nessas milhares de pessoas cujo desaparecimento foi registrado por familiares, alguns estados e o Distrito Federal se destacam. A taxa deste oscila em torno de cem por cem mil; a de SP aumenta bruscamente a partir de 2009, dobrando a taxa apresentada em 2007 e chegando perto dos 80 por cem mil. Na do Rio de Janeiro, onde imperaria o crime, não há aumentos significativos, e a taxa fica em torno dos 30 por cem mil.
Ora, no imaginário alimentado por romances e filmes policiais, alguns fatos narrados por pessoas comuns e o bom senso indicam que pode haver muita volatilização de corpos, o que impediria o registro da morte da infeliz criatura que não vai ter nem choro, nem vela, nem fita amarela. Quantos poderiam ser de fato mortes violentas? Onde moravam os sumidos? Há também a categoria mortes indefinidas que são corpos encontrados na via pública sem definição da causa da morte. Outra categoria é a de mortes por agressão ignoradas, quando não houve investigação para precisar se foi homicídio, acidente ou suicídio. Todas essas mortes estranhas são diferentemente registradas pelas secretarias de Segurança e de Saúde nos estados e atingem percentuais elevados, mas variando segundo o estado e o ano. Quando investigadas, a localização dos ignorados e parte das indefinidas corresponde à mancha dos homicídios concentrados nas regiões mais pobres da cidade: a dos subúrbios (AP3), a da Zona Oeste (AP5) e o entorno das favelas espalhadas em outras áreas também.
Em 2006, o PCC realizou uma operação de terror, matando policiais e chacinando membros das facções inimigas dentro e fora das prisões de SP. Foi assim que se tornou o único comando nesse estado. Nunca foram investigadas as 564 mortes durante os dois dias em que a cidade de São Paulo parou. Sabe-se também, pelas pesquisas feitas na periferia da cidade, que o PCC, como todo cartel ou máfia hierarquizada, julga e pune os que desobedecem ao seu código que proíbe mortes por vingança, expulsando ou matando quem fere seus interesses de negócio ilegal, mas evitando mortes que chamem atenção. Quantos desses punidos pelo PCC são os desaparecidos que começaram a subir logo depois das rebeliões, os que deveriam ser somados os indefinidos e ignorados? O PCC estende o seu domínio pelo Brasil. No Nordeste e no Norte, promoveu em 2016 rebeliões em prisões e chacinas fora delas. No Rio de Janeiro, parece ocorrer operação de pânico feita contra transeuntes, membros dos comandos locais e policiais. A investigação sobre essa movimentação deveria estar sendo feita pelos serviços de inteligência militares e da Polícia Federal. Esta é a ação federal necessária para enfrentarmos o preocupante aumento da criminalidade no país.
Alba Zaluar
Nenhum comentário:
Postar um comentário