segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Populistas ouvem muito bem

Não me entenda errado. Adoro explicações simples. Tanto quando qualquer outra pessoa. Elas fazem a vida mais simples, as decisões mais fáceis, e servem para dar sentido a situações complexas. O único problema é que explicações simples para problemas complexos estão quase sempre erradas. E levam a nada.

Por definição, deveríamos tomar muito cuidado com a singeleza de argumentos apresentados para justificar questões importantes ou ações com impacto generalizado. Enxergar o mundo de maneira simplista não implica simplificar o mundo. É somente miopia. E em alguns casos, cegueira.

Surpreende, portanto, que, diante da emergência de tantas e óbvias questões importantes, a gente permanece agarrado a explicações cujo conteúdo tem a profundidade de um pires. E este apego parece não respeitar fronteiras. É global.

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No mundo todo, governantes recebem maciça, e (acredito) na maioria dos casos, justificada, cobertura negativa. Ao mesmo tempo, são eleitos, tem votações significativas, ou se mantem no poder. Governantes são eleitos apesar de acusações de corrupção, posições racistas, extremistas, sexistas, e muitos outros “istas”.

Interessantemente, explicações parecem ser repetitivas. Aqui e ali, o comportamento da grande mídia e a qualidade dos eleitores são alvos preferidos. E o casuísmo dos argumentos, uma constante.

A grande mídia, seria responsável coberturas parciais, atacando inimigos de plantão ou defendendo valores democráticos, dependendo a quem se pergunta. Não importa. Explica-se a inefetividade dos ataques como uma consequência da qualidade dos eleitores. Eles seriam por natureza de extrema direita, conservadores, talvez racistas, insensíveis. Generalizada deformação de caráter.

Nesta visão, eleitores não seriam capazes de discernimento e, portanto, sem condições de escolher bons representantes. A não ser, claro, que escolham aqueles que preferimos. Ou seja, eleitores são sempre culpados pelos desastres.

É um ponto de vista. Um pouco simplista, mas, na democracia, é legitimo, mas cômodo demais pensar assim. Tem também a vantagem de eximir de qualquer responsabilidade aqueles que, em qualquer outra circunstancias, se autoproclamam formadores de opinião.

Mas existem outras opções. Uma delas é que governantes com discursos frequentemente hidrofóbicos, em alguma parte de suas palavras ou ações, estejam tocando e atendendo necessidades de grandes segmentos das populações que (certo ou errado) não estavam sendo ouvidos anteriormente.

Existir é escolher. E escolhas se dão entre opções existentes. Portanto, a baixa qualidade dos líderes eleitos reflete a incapacidade dos (autoproclamados) formadores de opinião, dos sistemas políticos, dos políticos, e dos intelectuais, de propor opções ou alternativas que minimamente atendam estes grandes segmentos das populações que servem de base de suporte para políticos que, em qualquer outra circunstância, seriam considerados, na melhor das hipóteses, exóticos.

Antes de ser uma vitória dos extremistas, a eleição de políticos alinhados com valores menos democráticos é comente uma consequência da incompetência generalizada dos líderes políticos em propor alternativas e soluções aceitáveis para a maioria. Falharam em ouvir os eleitores. E, portanto, em representa-los.

Nestes tempos estranhos, não é a qualidade das ideias e ideais a principal força eleitoral. É a capacidade de ouvir e minimamente ocupar os vácuos deixados pelo deserto de homens e ideias que assola o mundo. Não é falta de palavras. Falam até demais. É desinteresse ou surdez.

Por isto perdem para populismo. Populistas tem muitos defeitos. Mas ouvem muito bem.

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