Para além da mitologia, trata-se de uma parábola sobre o bem e o mal. Até que ponto um homem virtuoso será capaz de resistir à tentação de proceder sempre retamente? Faria o mesmo caso soubesse que poderia agir como quisesse e, ainda assim, ficar impune? Qual o limite da virtude? Poucos dias faz vimos, em Palmares, pessoas humildes se preparando para invadir um supermercado. Era errado mas o fariam. A polícia é que não deixou. Em Olinda, numa greve da PM, o supermercado da Arcomix foi assaltado por uma pequena multidão. Inclusive fiéis que iam, todos os dias, a missas e cultos evangélicos. Não é uma questão simples.
Mas penso que nosso grande padre Sérgio não pensava propriamente em questões íntimas, quando se referiu a essa lenda. Talvez estivesse apenas sugerindo que, em Brasília, nossas elites políticas agem como se estivessem acima do bem e do mal. Carlos Pena Filho, poeta do azul, começa um soneto (“A Solidão e sua Porta”) dizendo: Quando mais nada existir que valha/ A pena de viver e a dor de amar. Pois naquelas bandas, amigos, vale a pena, a dor e sobretudo a grana. Eles topam tudo por dinheiro. Sem nenhuma poesia. Como se todos usassem, nos dedos, o tal anel de Gyges.
Para sorte nossa, por aqui, parece que tais anéis nem sempre funcionam bem. Por conta de algum defeito de mecanismo. Razão pela qual muita coisa finda por aparecer. Não tanto, é pena. Mas aparece. Penso em Gyges nascendo no Brasil. Onde estaria ele, hoje, com seu anel? Talvez fosse Presidente da República – conversando escondido coisas escondidas, noite alta, com quem deve e não deve. Ou talvez se apresentasse às massas, com lágrimas falsas nos olhos, como se fosse o Salvador da Pátria. Ou talvez, para seu azar, estivesse preso em Curitiba. Pensando em fazer delação premiada. Tudo é possível. O Brasil é muito mais complicado que a Grécia de Platão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário