É natural que o clima de alarme que se estabeleceu no Congresso tenha dado alento a temores de que, em condições tão adversas, o Planalto não consiga aprovar as reformas que pretende tramitar na curta janela de oportunidade, de pouco mais de seis meses, com que ainda conta. Já no início de outubro, o encerramento do prazo legal de refiliação partidária deverá deflagrar desarticulação de parte substancial da base aliada, na esteira do reposicionamento de forças políticas para a disputa das eleições de 2018.
Em meio a esses temores, vem ganhando força a ideia de que o país estaria diante de inescapável dilema. Ou bem leva o combate à corrupção às últimas consequências ou bem aprova o programa de reformas que garantirá a saída da colossal crise em que foi metido. E não falta quem já se disponha a arguir que, nessas circunstâncias, as urgências do combate à corrupção deveriam ceder o passo ao avanço da agenda de superação da crise econômica.
O que se alega, com os eufemismos de praxe, é que o Congresso precisa ser “tranquilizado”. E em que consistiria tal tranquilização? Desde que o STF se dispôs a investigar a lisura de doações eleitorais de caixa 1, o nome do jogo no Congresso já não é mais tentar legalizar às pressas as de caixa 2. A saída mais promissora passou a ser apostar na prescrição de penas, tendo em vista a incapacidade da PGR e do STF de dar vazão a número tão grande de inquéritos e processos.
Mas, para estarem aptos a persistir nessa aposta, os parlamentares sob investigação não podem perder o foro privilegiado. Terão de ser reeleitos, custe o que custar. E aqui reside a dificuldade. Como um parlamentar com imagem devastada por processos baseados em delações amplamente divulgadas poderá disputar com sucesso as eleições de 2018?
No Congresso, já se trama a solução. Uma reforma eleitoral a toque de caixa para introduzir um sistema de listas fechadas. Reformas nessa linha vêm sendo aventadas no Congresso há muitos anos, especialmente pelo PT. E até têm seus méritos. Mas o que agora despertou súbito fascínio dos demais partidos pelo sistema de listas fechadas é a perspectiva de que possa ser usado para garantir a reeleição de quem precisa se esconder dos eleitores.
Para não ter de se apresentar de cara limpa ao eleitorado, o parlamentar se apresentaria veladamente, sob o manto de uma lista de nomes preordenados pelas cúpulas partidárias, com lugar assegurado entre os primeiros candidatos arrolados. A lista fechada propiciaria uma espécie de burca para que o candidato sob investigação possa ser eleito sem ter de se expor ao eleitorado.
Antes de deixar suas digitais na trama da tranquilização, em nome da aprovação das reformas, o Planalto deveria refletir sobre as reais proporções dos desafios que ainda terá de enfrentar para manter a economia na rota de saída da crise.
Para que o plano de mudança paulatina do regime fiscal funcione, não basta que as reformas contempladas para 2017 sejam aprovadas. É fundamental que o país possa vislumbrar, de forma crível, que o esforço de ajuste fiscal terá seguimento no próximo mandato presidencial. O que exigirá formação de coalizão política eficaz em torno de um candidato a presidente comprometido com a consolidação fiscal. E com boa chance de vitória em 2018.
Tanto o Planalto quanto os partidos que se creem capazes de lançar um candidato com esse perfil precisam ter em conta que, na campanha de 2018, a questão da corrupção deverá atrair muita atenção do eleitorado. Especialmente se a trama da tranquilização tiver tido sucesso. E, nesse quadro, a eleição de candidato a presidente vinculado a partido conspurcado por envolvimento nessa trama está fadada a se tornar missão impossível.
Rogério Furquim Werneck
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