Goste-se de Lula ou não, há que se reconhecer sua capacidade de enxergar adiante e de usar a seu favor tudo que possa desfavorecê-lo. Foi assim quando acusou o Congresso de abrigar 300 picaretas.
De novo quando chamou o pagamento de propina a deputados de simples caixa dois. E mais uma vez ao propor uma reforma política que introduziria o voto fechado em listas apresentadas pelos partidos.
Está sendo assim outra vez quando Lula se exibe como vítima de perseguição movida por Sérgio Moro.
Se no passado se oferecia como um político diferente dos demais para melhor, agora torce para que o eleitor pelo menos admita que ele é igual e não lhe negue o voto.
Seria uma versão atualizada do “rouba, mas faz” do ex-governador paulista Adhemar de Barros. “Rouba, mas faz pelos pobres”.
Essa é conversa para outro dia. De volta ao início.
Em 1993, candidato a presidente no ano seguinte, Lula cometeu a frase que lhe reforçou a fama de bom moço: “Há uma maioria de 300 picaretas no Congresso que defendem apenas seus próprios interesses”. Foi também bom observador.
Àquela altura, concluíra que sem os picaretas jamais chegaria lá. Por paradoxal, espancá-los seria uma forma de atrai-los mais tarde. Como ficou demonstrado.
"O que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente", disse Lula em julho de 1995. O escândalo do mensalão ameaçava tirá-lo da presidência. A renúncia ao cargo estava no seu radar.
Esperto, quis transformar o caso de desvio de dinheiro público para a compra de apoio no Congresso na infração eleitoral batizada de caixa dois. É ou não é o que fazem, hoje, os enrascados na Lava Jato?
O mensalão levou Lula a propor uma reforma política que substituísse o voto no candidato de livre escolha do eleitor pelo voto na lista fechada de candidatos dos partidos.
Com isso, o PT tentaria salvar suas estrelas atingidas pelo escândalo. Elas se elegeriam sem que você votasse diretamente nelas. Não deu certo. A ideia foi resgatada para salvar os citados na Lista de Janot.
Se vivo fosse, PC Farias, ex-tesoureiro da campanha presidencial de Fernando Collor em 1989, os chamaria de “hipócritas”.
PC calou seus inquisidores na CPI da corrupção em 1992 ao levantar a voz e proclamar sem meias palavras: “Nós estamos todos sendo hipócritas aqui”. Para defender-se da acusação de roubar, garantia que tudo não passara de caixa dois.
Não ponha fé na punição rigorosa dos sem escrúpulos. Ao estrago das delações em sua imagem capaz de varrê-los da vida pública, tentarão opor a anistia ao caixa dois, o voto em lista fechada e o aumento milionário da verba para o fundo partidário.
Em ilegítima defesa, até chantagearão a Justiça com a ameaça de desvendar quantos togados ganham mais do que a lei autoriza.
Sem chance de a Justiça condenar em definitivo antes das próximas eleições um único suspeito de prevaricar.
Os juízes não limitam suas decisões ao estrito cumprimento da lei. Detêm-se sobre a conjuntura política do país. Não foi assim quando escolheram engolir a afronta de Renan Calheiros que ignorou ordem de se afastar da presidência do Senado?
Que o que se passa no Brasil sirva para orientar o eleitor na hora de votar. Em 1996, uma CPI recomendou a cassação dos mandatos de 69 deputados e de três senadores suspeitos de superfaturar o preço de ambulâncias.
Nenhum foi cassado. Mas dois deputados renunciaram. E dos 67 restantes, só cinco se reelegeram. Dos três senadores, só um.
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