segunda-feira, 20 de março de 2017

A podridão é por nossa conta

A carne é fraca. Todos sabemos. É de conhecimento público e notório. Está na bíblia. É fraca, mas não precisa ser podre. Só apodrece quando o espirito se corrompe.

É possível, claro, olhar para a corrupção como uma serie de condutas individuais não relacionadas. Mas isso seria de interesse quase exclusivo de criminalistas, advogados de defesa, juízes, operadores de direto, enfim. Para todos os demais, talvez seja mais importante o caráter endêmico da corrupção.


A lei dos grandes números demonstra que indivíduos, quanto analisados separadamente são extremamente imprevisíveis. Mas em conjunto, seu comportamento é semelhante, previsível, enfim.

Portanto, corrupção endêmica implica que parcelas significativas de setores que controlam recursos são expostas a ambientes que favorecem este comportamento e explicam a incidência que forma a endemia. Explica, mas não justifica, claro. Em outras palavras, ambiente favorece e incentiva a corrupção.

Seria mais simples se a incidência da corrupção pudesse ser explicada somente pela falha de órgãos de controle ou ausência de marco regulatório para sua contenção. Seria simples, fácil, mas é falso. Corrupção neste volume tem em sua raiz incentivos que favorecem aqueles que a praticam. E isso muda tudo.

Durante muito tempo, alegou-se que corrupção é problema moral, não econômico. Nada mais falso. Corrupção, quando endêmica, é problema econômico sério. Ela muda a maneira como se define o sucesso, como se conduz negócios, e como se selecionam líderes em todas as esferas, pública ou privada.

Quando as relações econômicas se definem através da corrupção, o sucesso é proporcional a capacidade de adaptação e habilidade não operação da corrupção. E, portanto, é a familiaridade do indivíduo com estes métodos que determinarão suas oportunidades econômicas e profissionais.

No tempo, a exposição a estas regras de seleção natural faz com que os lideres, públicos ou privados, sejam escolhidos baseados em sua capacidade de operar em ambiente corrupto. Outras variáveis, como conhecimento, dedicação, produtividade, talento, ficam em segundo plano.

E o resultado é ruim para todos. O foco deixa de ser produzir e passa a ser gerenciar teia de relações que possam criar privilégios e facilidades. E, portanto, deixa de importar a qualidade dos produtos ou serviços, públicos ou privados.

Vem a degradação. Nada é entregue no prazo ou dentro do orçamento. E, uma vez entregue, a qualidade é, parar ser educado, duvidosa. Ou simplesmente irreconhecível.

Corrupção custa dinheiro, saúde, vidas, felicidade. Corrupção endêmica, cria oportunidades e retornos para corruptos. E estas oportunidades se transformam em incentivos. Ou, se preferimos, tentações.

Somente será possível diminuir a corrupção se este sistema de incentivos que a gera for reformado. A carne, afinal, é fraca. Mas a podridão é por nossa conta.

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