sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

Controle de nações

Por trás da revelação feita pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, com base em investigações da Operação Lava Jato, de que a Odebrecht pagou mais de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 3,4 bilhões) em propinas em 12 países desde 2001, está muito mais do que um esquema internacional de corrupção.

Tal prática é uma ameaça concreta à estabilidade democrática dos países. Pelo que foi levantado até agora pela força-tarefa da Lava Jato, a empresa teria bancado o pagamento de marqueteiros das campanhas de candidatos vitoriosos a presidente da República em alguns dos países onde tinha interesses comerciais, via caixa 2 ou dinheiro de propina.

Desse modo, passou a empresa a ter – ou a planejar ter – o controle sobre governos, programas de governos, cronogramas de obras.

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Com base em delações negociadas entre executivos e ex-executivos da Odebrecht aqui no Brasil, existe a informação de que medidas provisórias que interessavam à Odebrecht foram compradas por alguns milhões, pagos a burocratas, funcionários do governo e dirigentes partidários, possibilitando um retorno bilionário ao caixa da companhia. Se no Brasil houve a compra de MPs e leis, quem pode dizer que o mesmo não aconteceu nos outros países onde o conglomerado empresarial tinha interesses?

Há algum tempo estudiosos da geopolítica do mundo acreditam que a guerra convencional chegará ao fim. Prevalecerá os interesses de grandes grupos econômicos, que tudo farão para manter a hegemonia sobre outros e, principalmente, sobre as nações, simples joguete em suas mãos.

Criada em 1899, a americana United Fruit Company ficou muito conhecida no mundo, principalmente na América Latina. Financiou golpes de Estado e guerras civis nos quais a atuação do governo local ameaçava seus interesses. No lugar de quem ela derrubava, sempre era posto um fantoche. O Prêmio Nobel de Literatura Gabriel Garcia Márquez dedicou um bom espaço de sua obra Cem Anos de Solidão à United Fruit, identificando-a com massacre de trabalhadores, a negação de direitos sociais, sindicais e humanos, o clientelismo político e o suborno.

Do mesmo modo, também Nobel de Literatura, o escritor chileno Pablo Neruda escreveu um poema chamado La United Fruit Co, publicado em Canto General. Depois de dizer que a empresa se instalou também na costa central de sua terra, ele afirma que a companhia batizou de novo as terras chilenas, agora de “República de Bananas”. “E sobre os mortos dormidos, sobre os heróis inquietos que conquistaram a grandeza, a liberdade e as bandeiras, estabeleceu sua ópera bufa”. Em seguida, Neruda enumera os nomes dos fantoches que a United Fruit levou ao poder países afora.

Boa parte dos movimentos de esquerda na América Latina se fortaleceu na luta contra a empresa americana, principalmente na primeira metade do século 20 e depois da Segunda Guerra.

Há semelhanças entre a atuação da Odebrecht e a da United Fruit na luta pelo poder, com a diferença de que agora não há o emprego da violência. A americana financiava golpes contra governos estáveis e democráticos. A Odebrecht passou a financiar governos instáveis com os quais mantinha negócios, quase todos eles de centro-esquerda.

O que diriam Karl Marx, Rosa Luxemburgo, Lenin e outros se soubessem que em um futuro não muito distante parte daqueles que se inspirou em seus ideais revolucionários acabaria por se desmoralizar pelo dinheiro do Brasil?

A respeito de toda essa questão que envolve o domínio de nações pelo interesse de empresas, diz o ex-deputado petista Paulo Delgado (MG): “Ironia da história o passado se parecer com o presente. A nossa esquerda, que em parte se formou na luta contra a United Fruit Company, se desmoraliza pedindo dinheiro à United Odebrecht Company”.

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