terça-feira, 11 de outubro de 2016

Ora direis ouvir estrelas

Estes são versos de Olavo Bilac: “Ora direis ouvir estrelas! Certo, perdeste o senso! E eu vos direi, no entanto, que, para ouvi-las, muita vez desperto e abro as janelas, pálido de espanto e conversamos toda a noite...”. Mais adiante, Mario Quintana escreveu: “Se as coisas são inatingíveis... ora! Não é motivo para não querê-las... Que tristes os caminhos, se não fora a presença distante das estrelas!”

Saint-John Perse, ao receber o Prêmio Nobel de Literatura de 1960, afirmou, com extrema sensibilidade e sabedoria: “... se a poesia não é, como se disse, o ‘real absoluto’, é certamente a mais próxima apreensão desse real, nesse limite extremo de cumplicidade em que, no poema, o real parece informar-se a si mesmo”.

Os tempos atuais estão tão confusos que irrompe a convicção da necessidade de voltarmos a olhar as estrelas em busca de inspiração. São tantas as informações que se recebe que já não se sabe discernir o que é importante para a felicidade dos povos.

<3:

Valores éticos são como estrelas no céu social — inspiram e indicam direções seguras e permanentes para a construção do “Humanismo integral” — a história orientada para a promoção da dignidade da pessoa humana. Voltemos a contemplá-las como se faz com as outras estrelas: Olhem a constelação da Justiça! Prestem atenção no conglomerado da liberdade! Não deixem de contemplar o esplendor do conjunto da democracia! Cantemos a beleza luminosa da galáxia da paz! Não esqueçamos de nos extasiarmos com o cintilante cinturão da solidariedade!

Muito mais importante do que taxas de inflação, de criminalidade, índices de desemprego, indicadores de poupança e de desenvolvimento, de leis que regulamentem as migrações e o comercio internacional, é o conhecimento e a crença arraigada nos valores éticos explicitados ao longo dos séculos, por uma humanidade sequiosa de poder viver em sociedades que proporcionem, a todos, oportunidades de felicidade, justiça, liberdade e segurança. Tais progressivas explicitações da democracia, fruto da liberdade e da racionalidade humana, são as fontes seguras de permanente inspiração para o aperfeiçoamento do viver coletivo. Na procura de soluções para os graves problemas que se avolumam, precisamos voltar a sonhar, centrando nossas atenções nas estrelas do céu social, os seguros faróis dos povos. Recorrer a elas nestes momentos de confusão e perplexidade, não como mais uma alternativa a ser tentada, mas como a única verdadeira solução possível.

As religiões cristãs deveriam estar à frente desta campanha de recuperação do espirito do “Humanismo integral”. Os historiadores são praticamente unânimes em ensinar que a Europa, berço da nossa civilização ocidental, é culturalmente, nos seus fundamentos, essencialmente judaico-cristã. Resta recuperar esta fonte inicial de inspiração para, só então, procurarmos equacionar, com lógica, os problemas concretos das nossas sociedades.

Os sonhos coletivos necessariamente precedem às ações políticas. É importante que possamos voltar a sonhar com fé, alegria e esperanças.

Enquanto não realizarmos uma revolução educacional de qualidade e uma reforma política radical — que possibilite o mais efetivo acesso ao poder dos melhores e mais competentes candidatos, principalmente no Poder Legislativo (“o supremo poder”), recuperando a prevalência, no ambiente cultural dos nossos dias, dos pressupostos éticos que conformaram a nossa civilização — não sairemos da miserável, desesperançada e triste situação em que atualmente vivemos.

Eurico Borba

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