O que menos importa no “escândalo” (termo sem significado) dos nadadores olímpicos norte-americanos é que tenham empanado seus extraordinários feitos atléticos. Formular uma denúncia falsa é crime, nos Estados Unidos, no Brasil e no mundo todo. Fazê-lo no Rio foi, além disso, de péssimo gosto, uma cidade seriamente afligida pelo crime, entre outros infortúnios.
Para depois voltar para casa tão elegantemente vestidos. E tudo para esconder uma simples noite de farra. Talvez com a fotossíntese do amanhecer tenham sido capazes de se lembrar dos contratos publicitários em vigor.
O problema maior, no entanto, e que os atletas provavelmente sequer imaginam, é que o incidente evoca o pior das relações entre Estados Unidos e América Latina. Nesse quintal, às vezes cassino, outras bordel, é possível fazer o que não se faz em casa. Farrear, transgredir, embebedar-se, depredar e depois voltar sorrindo.
O incidente dos nadadores olímpicos evoca o pior das relações entre Estados Unidos e América Latina
Ali não há muita lei, de qualquer forma; então parece não fazer diferença. Daí as reações. Sem saber, os nadadores recriaram a Nicarágua dos Somoza, a Cuba de Batista ou a República Dominicana de Trujillo. Não se trata de Guerra Fria, pois tudo isso é muito anterior. É só lembrar-se de William Walker, presidente da Nicarágua em 1856-57, de nacionalidade norte-americana.
Lugar de exploração e aventura, como nas lojas da grife Banana Republic, essa é justamente a história que torna a ser contada. Mas trata-se de uma história que já não funciona, e menos ainda no Brasil. Acossado pelo crime e pela corrupção, pela recessão e pelo desemprego, a crise política e o zika, apesar de tudo o Brasil tem Estado.
Mais ainda, seu poder judiciário é provavelmente o de maior profissionalismo da região e certamente o de maior independência do poder político. O instante em que Gunnar Bentze e Jack Conger são desembarcados de um avião, têm seus passaportes retidos e são colocados à disposição das autoridades revela isso.
Esse instante também deve ter tido um certo sabor de reparação do orgulho nacional brasileiro, tão ferido ultimamente. E para todos os demais significa que faz muito tempo que o quintal resiste a ser quintal.
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