quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Alea jacta est

Em 49 A.C., após um longo tempo de indecisão, Júlio Cesar atravessou o Rubicão entrando na cidade de Roma depois de pronunciar sua célebre frase “a sorte está lançada”. O vice-presidente Michel Temer não é um Júlio Cesar, está longe disto. Mas, com sua carta à presidente Dilma Rousseff, tomou um caminho sem volta. Atravessou seu rubicão.

A conferir quantas legiões Temer possui, mas, sem dúvida, sua mudança de lado -- mesmo camuflada como um desabafo -- é nitroglicerina pura.

Concretamente, pode fazer a balança pender desfavoravelmente para a presidente, como ocorreu na definição da chapa da oposição para comissão que analisará o mérito do impeachment.


A esta altura, impossível prever como será o desfecho da crise política, se ela se prolongará, ou não, mesmo depois do pronunciamento do Congresso Nacional sobre o processo de afastamento da presidente.

E a guinada do vice, um político matreiro e de sangue-frio, não desarma os espíritos. Pode até ter efeito contrário. Ao perder um aliado tão importante, a tendência do governo será aprofundar do balcão de negócios como forma de assegurar os votos necessários para evitar o impedimento de Dilma.

O cabo de guerra no Congresso, com Eduardo Cunha jogando farofa no ventilador e o Planalto utilizando-se de todos os métodos para manter Dilma no poder, cria a real possibilidade da chamada judicialização da crise, com o STF sendo provocado a se pronunciar a cada instante. Anuncia-se, assim, uma agonia sem fim.

O lulopetismo tende ainda a assumir uma postura jihadista nas ruas, inclusive na hipótese de um governo Michel Temer. O brado de “impeachment é golpe” é apenas o prenúncio da agudização da linha “classe versus classe” que o PT adora assumir em praça pública, embora por baixo dos panos radicalize em acordos espúrios.

Seja como for, a carta do vice expõe as vísceras de um modelo que produziu excrecências, como o casamento de girafa com hipopótamo.Em termos de ideário, nada aproxima PT e PMDB. Mas falaram mais alto o projeto de poder pelo poder do Partido dos Trabalhadores e o velho patrimonialismo de seus aliados.

Expõe também as limitações do principal cardeal peemedebista. Quem esperava uma peça de um estadista, algo para entrar para a história, como, por exemplo, a carta de Vargas, ou o discurso Mário Covas, de 12 de dezembro de 1968, no Congresso Nacional, contra a cassação de Márcio Moreira Alves, amargou o gosto da decepção.
A carta-desabafo resvala pelos caminhos da política menor. Mais grave: não transmite aos brasileiros a segurança de que Michel Temer está preparado para presidir o Brasil, em uma quadra tão delicada da nossa história.

A vice-presidência é uma instituição a ser preservada. Não pode ser parte do conflito, até para ser a solução largamente consensual e constitucional na hipótese extrema de impedimento da primeira mandatária. Se há algum padrão no qual devemos nos referenciar, ele atende pelo nome de Itamar Franco.

Nosso problema não é atravessar o Rubicão. É atravessar, urgentemente, o enorme buraco no qual o Brasil foi jogado, por culpa dos governos lulopetistas. Os interesses gerais do país não podem estar submetidos à luta política imediata.

O desemprego, a inflação, a recessão, não serão enfrentados enquanto a crise política não for equacionada. Postergar sua solução é uma irresponsabilidade, um atentado contra o povo. Como poderá a nação ficar parada, em compasso de espera, se o Congresso entrar em recesso e não apreciar o pedido de impeachment? Tamanha insanidade é inadmissível.

Alea jacta est.

Que cada um e todos assumam suas responsabilidades. Perante os brasileiros e a história.

Hubert Alquéres 

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