Uma pessoa ou instituição pode cumprir papéis diferentes em momentos diferentes. Anteriormente paladino da luta contra a corrupção e pelos direitos dos trabalhadores, o PT e seu governo são hoje acusados de corrupção e passaram a adotar políticas que contrariam seu programa histórico.
A crise do governo Dilma fez a esquerda perder o centro, que se deslocou para a direita. Um indicador é a intenção de voto em Bolsonaro — 5% — enquanto o governo amarga uma aprovação de apenas 10%. Outro indicador foi a ascensão política do presidente da Câmara, que ainda lidera a agenda da direita no Congresso, com o apoio da oposição, apesar das denúncias comprovadas de corrupção.
A proposta de impeachment da presidente Dilma sempre esteve no campo da possibilidade, mas não da probabilidade, por falta de base jurídica — não há crime — e apoio político. A oposição tumultua para manter o governo na defensiva, com uma espada de Dâmocles pendente. Já declararam ser contra o impeachment o Bradesco, o Itaú, confederações patronais, diversos empresários, até mesmo o “New York Times", o que sugere um acordo. Talvez tenham concluído que o tumultuado processo traria prejuízos econômicos para todos.
Pela esquerda, aqueles que criticam o governo são contra o impeachment: pensam que a alternativa seria pior. E os que apoiam o governo limitam-se a denunciar que há um golpe em marcha. Mas, do ponto de vista político, econômico e moral, a situação é grave. O governo se enfraqueceu a ponto de deixar a economia nas mãos de um ministro indicado pelo Bradesco, e de aceitar subordinação política ao PMDB.
Ao realizar um ajuste fiscal sacrificando sobretudo os pobres, Dilma fez o contrário do que havia prometido e perdeu credibilidade. Recuperá-la, exigiria um Ministério respeitado pela sociedade, o que não foi preocupação dela, como se vê pelos ministros da sua cota pessoal. O governo não negociou sua agenda com os setores sociais afetados e, no ajuste fiscal, não penalizou o setor financeiro, que reina, soberano, na política econômica.
O tempo é também uma categoria política. Uma ação ganha ou perde validade com o seu transcorrer. Nesse sentido, a reforma ministerial chegou tarde demais e agravou, em vez de melhorar, a imagem política do governo.
Alguns analistas afirmaram que o único caminho seria a presidente propor um pacto envolvendo os ex-presidentes FH e Lula e o vice Michel Temer. Um pacto pluripartidário definiria um programa político e econômico para o Brasil sair da crise.
Mas também aqui o tempo é decisivo. Se demorar, nem um pacto impediria o risco de abertura do processo de impeachment, que pode se viabilizar pelo agravamento da crise econômica, sobredeterminado pela decisão do TCU sobre as pedaladas fiscais e pelo processo no TSE sobre alegadas ilegalidades na campanha eleitoral.
Em vez de pacto, o caminho escolhido foi aumentar a presença do PMDB no governo para, a curto prazo, impedir o impeachment da presidente. A médio prazo, porém, pode ser um desastre. E talvez, então, seja tarde demais para um pacto.
Liszt Vieira
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