A questão parece desafiadora e complexa, já que a principal receita dos jornais impressos provém da publicidade, muito superiores à receita conseguida por sua venda avulsa, incluindo as bancas tradicionais e as assinaturas.
A publicidade está presente, porém em escala muito menor nas edições digitais do que nas edições impressas. É natural porque as edições impressas são lidas em média por cerca de 2,5 pessoas cada uma, enquanto os acessos digitais são unitários. A ANJ, no comunicado através de O Globo acentua que, no mundo todo os jornais impressos reúnem um universo de 2,5 bilhões de leitores por dia. O que dá uma média aproximada de 700 milhões de exemplares. Mas esta é outra questão.
A questão da credibilidade e da autenticidade da informação e da análise encontra-se muito mais nas edições impressas e digitais quando da responsabilidade das empresas jornalísticas. Mais do que nas redes sociais em geral, por um motivo muito simples: nos jornais e nas emissoras de televisão funcionam editores selecionando as matérias a serem produzidas. Não é o caso das redes sociais, nas quais cada um é editor de si mesmo. Por este motivo é que informações divulgadas através de redes sociais levam a todos nós a buscar a plena confirmação nas matérias dos jornais digitais e nas edições impressas no dia seguinte. Nas edições digitais podem ou não serem confirmadas no mesmo dia. Faço a ressalva para atribuir o devido valor a essa forma moderna e feliz de comunicação.
Voltando ao tema título, entretanto, retornando assim à colocação de Bucci, devemos todos nós, jornalistas ou não, considerar a diferença entre o jornalismo e a publicidade. O jornalismo parte sempre de um teorema, algo que precisa ser comprovado na prática, completamente diverso da publicidade comercial, que tem origem num axioma, na matemática algo para o qual não há necessidade de confirmação.
Como então convivem duas rotas paralelas que, por definição nunca se encontram? A resposta é simples. O jornalismo alimenta a publicidade, torna-se seu veículo insubstituível, enquanto a publicidade adquire os espaços para veicular seus propósitos, ofertas e mensagens. A liberdade de imprensa, como assinalou muito bem Eugênio Bucci, não depende da publicidade. Em muitos casos os choques são evidentes.
Por exemplo, veja-se o caso específico da Odebrecht, uma das maiores anunciantes do país. Mas nem por isso jornais como O Globo, a Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo e o Valor deixaram de noticiar com grande destaque as acusações da operação Lava-jato que pesam contra a empresa e pessoalmente contra seu presidente, Marcelo Odebrecht, herdeiro de uma grande potência empresarial. Pelo contrário.
Basta ler os jornais de 3 de setembro sendo que o Estado de São Paulo publicou editorial afirmando que no seu depoimento a CPI da Petrobrás verificou-se uma vassalagem por parte de alguns deputados em relação a ele. Tal vassalagem, acrescentou o jornal, só pode ter uma razão: a dependência expressa daqueles parlamentares a financiamentos recebidos da empresa em campanhas eleitorais ou fora delas. Outra prova de desvinculação total entre a publicidade e o jornalismo também pode ser encontrada nas edições de quinta-feira que focalizaram a débâcle da Unimed em São Paulo.
A Unimed é outra grande anunciante e nem por isso foi refrescada pelos fatos que a levaram a ter que transferir 774 mil clientes inscritos em seu seguro saúde para outras empresas que desejarem assumir as responsabilidades que lhe pertenciam e que não teve condições de cumprir. Uma reportagem de Paula Felix, na mesma edição de O Estado de São Paulo, destacou o problema da empresa e das dificuldades que os clientes encontrarão para se transferirem a novos planos como foi determinado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar.
Poderíamos citar uma série infindável de outros exemplo. Porém esses dois são suficientes. Uma coisa é a publicidade comercial, outra é o jornalismo profissional. Os leitores e administradores públicos e privados não se devem deixar iludir quando alguém lhes apontar uma conveniente convergência que, na prática, não existe. Fica aqui esta informação que julgo importante e fundamental.
Pedro do Coutto
Nenhum comentário:
Postar um comentário