Se os órgãos de defesa do consumidor tivessem poder, o marqueteiro João Santana seria proibido de exercer a profissão pela propaganda enganosa que foi a campanha da doutora Dilma à reeleição. Noves fora isso, há um cheiro de satanização no inquérito que a Polícia Federal abriu em cima de sua empresa.
Pelo que se sabe, ele se tornou suspeito de lavar dinheiro para o PT. O primeiro lance dessa lavagem estaria no fato de ter trazido para o Brasil o equivalente a R$ 33 milhões ganhos na marquetagem da campanha do presidente José Eduardo dos Santos em Angola.
Santana atravessou o oceano para escorregar numa casca de banana em Angola, país governado por Santos desde 1979. A filha do doutor é a mulher mais rica d'África, com uma fortuna estimada em US$ 3 bilhões. Se isso fosse pouco, em Angola estão fincadas estacas das grandes empreiteiras apanhadas na Lava-Jato.
O Conselho de Controle de Atividades Financeiras desconfiou do internamento do ervanário e comunicou o fato à Polícia Federal. Falta dizer qual é a base da desconfiança. Santana trouxe o dinheiro para o Brasil. Fez isso pela rede bancária, de acordo com as normas do Banco Central, e pagou R$ 6,29 milhões de impostos, equivalentes a 20% da transferência.
Seria coisa “atípica”, porém é lisa e benéfica. Nada a ver com os R$ 10,5 milhões pagos em 2003 pela Caixa Dois do PT ao marqueteiro Duda Mendonça e remetidos para uma conta num paraíso fiscal das Bahamas. São casos diferentes e até mesmo opostos.
A transação seria um disfarce. Em tese, as empreiteiras deram o dinheiro a Santana para cobrir os serviços que prestara no mesmo ano ao candidato petista Fernando Haddad na disputa pela prefeitura de São Paulo. Ao final da campanha, o PT lhe devia R$ 20 milhões, pagos em parcelas mensais de R$ 2 milhões. Documentada a quitação, a suspeita fica capenga.
Quem quiser continuar duvidando pode achar que a transferência do dinheiro angolano foi atípica para os próprios padrões de Santana. O dinheiro ganho em outras campanhas foi deixado em El Salvador e na Argentina. A empresa de Santana tem ainda uma filial na República Dominicana. Nenhum dos três países pode ser considerado um paraíso fiscal. Continua faltando um fiapo de prova do disfarce.
A linha que separa uma investigação de uma acusação é tênue e atravessá-la é perigoso. As diligências da Polícia Federal e do Ministério Público na Operação Lava-Jato prestaram um enorme serviço ao país e é de se esperar que façam mais. Mesmo assim, a transformação de uma suspeita num inquérito que ainda não ouviu Santana e, a esta altura, nada parece ter acrescentado à narrativa, ajuda quem joga com as pretas. Lances desse tipo tumultuam as investigações e beneficiam culpados.
Por exemplo: o policial pulando o muro da casa de João Vaccari Neto, que jamais se recusou a atender intimações policiais, ou a prorrogação da prisão de sua cunhada, confundida com a irmã. Ou ainda a afirmação de que as anotações de “PB” e “0,1” num caderno do “amigo Paulinho” indicavam o pagamento de uma propina de R$ 1 milhão ao ministro Paulo Bernardo.
Talvez “PB” fosse o Papa Bergoglio, porque Paulo Bernardo não foi denunciado pelo Ministério Público. Às vezes o que parece ser a cereja do bolo é apenas um caroço vermelho.
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