A sombra de duas derrotas assusta o governo e despertará, como consequência, o peso da ingovernabilidade. Serão letais tanto a rejeição das medidas provisórias do ajuste fiscal pela Câmara quanto, pelo Senado, do nome indicado para novo ministro do Supremo Tribunal Federal.
No primeiro caso, os deputados começam esta semana a apreciar a redução de direitos trabalhistas, desde o seguro-desemprego ao abono salarial e à extinção das pensões para viúvas com menos de 40 anos. A mobilização nos partidos é grande, encontrando-se todos rachados, inclusive o PT. As centrais sindicais pressionam para os deputados não aceitarem a diminuição de direitos trabalhistas consagrados faz muito. A base parlamentar do governo, desunida, pode não garantir a aprovação.
Quanto à não aprovação do nome do dr. Fachin pelos senadores, defendida pelo presidente do Senado, vai demorar um pouco mais, provavelmente estendendo-se até o final do mês. Será explosiva, se acontecer.
Na hipótese das duas derrotas, ficará claro que a presidente Dilma precisará governar sem o apoio do Congresso, missão impossível em tempos de democracia. A situação, mesmo às avessas, lembra o período final do governo João Goulart. Naqueles idos o presidente enfrentava os setores conservadores, contrários à reforma agrária e demais reformas de base. Optou por estabelecer as mudanças por atos do Executivo, despertando ainda maiores reações no Legislativo. No fundo do confronto conspiravam as elites econômicas e os militares, com forte penetração da classe média.
Madame ainda não se decidiu a bater cabeça com o Congresso, ainda que disponha de mecanismos para impor a recessão acima e além de deputados e senadores. Se o fizer, faltando na equação a presença dos militares, enfrentará a classe média mesclada aos setores sindicais.
A verdade é que o governo caminha célere para deixar de governar, caso não encontre para a crise econômica remédio melhor do que sacrificar a população. Os efeitos já se fazem sentir no aumento de preços, taxas e tarifas, com a redução do poder aquisitivo dos salários.
O fantasma do impeachment ainda não assusta, mas continuando as coisas como vão, logo dará as mãos à ingovernabilidade. Uma aliança perigosa. Quem anda de olho na crise é o Lula, disposto a ajudar a sucessora, mas trabalhando em paralelo para preservar-se como candidato em 2018. Mesmo assim, já não são poucos os companheiros soprando em seus ouvidos que “pode não dar tempo”. A ingovernabilidade e o impeachment funcionariam como antecipação do processo sucessório, em especial se Dilma e o seu vice se dispusessem a renunciar, possibilidade por enquanto inviável, mas, em termos de História do Brasil, factível.
A pergunta que fica é se o retorno do primeiro companheiro adiantaria para desatar o nó em que nos encontramos. Há quem julgue que não, porque ele, afinal, tem muita responsabilidade no que vai acontecendo. Precisaria pedir mais sacrifícios sem a compensação de distribuir benesses. Perderia a característica que o elevou ao poder.
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