Todos sabem que, na véspera do Carnaval, surgiu mais um constrangimento para a Petrobras, com a divulgação da notícia de que a Justiça determinou que seja hipotecado o edifício-sede da estatal, no centro do Rio de Janeiro, para garantir uma dívida de R$ 935 milhões. O valor é referente a uma indenização devida à refinaria de Manguinhos por supostos prejuízos causados, entre 2002 e 2008, pela política de preços de combustíveis praticada pela estatal.
O processo de Manguinhos contra a estatal foi iniciado em 2013 e pode durar mais de uma década. Na primeira instância, a Petrobras foi condenada a pagar a indenização em dezembro do ano passado. Com as dificuldades financeiras enfrentadas por causa da Operação Lava Jato, a refinaria Manguinhos entrou em janeiro com o pedido de hipoteca judicial, mas somente será executado caso se esgotem os recursos da Petrobras em todas as instâncias e a estatal seja definitivamente condenada a pagar a indenização.
A longeva e sucateada refinaria de Manguinhos, que pertencia à petroleira espanhola Repsol , já estava há anos à beira da falência quando foi arrendada pelo grupo Andrade Magro, do qual fazem parte as empresas Grandiflorum e a Ampar.
Em 2008, a família Magro assumiu o controle de Manguinhos e entregou a presidência da refinaria ao jornalista Marcelo Sereno, que tinha sido chefe de gabinete do ex-ministro José Dirceu na Casa Civil, era secretário nacional de Comunicação do PT e se tornara uma das principais testemunhas de defesa do deputado cassado no escândalo do mensalão. No PT, todos sabiam que Sereno era o braço-direito de Dirceu.
A família Magro era especialista em sonegação fiscal no setor de combustíveis e se aproximara de Sereno em 2002, quando ele era chefe de gabinete do governo da petista Benedita da Silva, uma gestão de apenas nove meses e que ficou conhecida por sua generosidade fiscal no trato com grandes sonegadores, digamos assim.
A quadrilha de Magro então passou a explorar uma modalidade de fraude possibilitada pelo uso, de forma irregular, de um regime especial de tributação concedido pela então governadora Benedita da Silva, que desobrigou as distribuidoras de recolher o imposto na origem (quando compravam o combustível na refinaria).
Para não pagar o ICMS também na venda aos postos, essas empresas trambiqueiras simulavam operações interestaduais de comércio de combustível. Era o golpe do chamado “passeio da nota”, no qual só as notas fiscais viajavam, enquanto o produto era vendido na rede de abastecimento do Rio de Janeiro.
Houve uma sucessão de liminares na Justiça do Rio, e a primeira empresa favorecida foi a Inca Combustíveis, de Hiroshi Abe Júnior, identificado pela Polícia como um dos “cabeças” da suposta quadrilha liderada por Magro.
Na Assembleia Legislativa do Rio, uma CPI apurou que, entre 2002 e 2006, o esquema teria produzido um rombo de pelo menos R$ 850 milhões na arrecadação. Embora o empresário Ricardo Magro insista em afirmar que só assumiu a refinaria em 2008, a Polícia e o Ministério Público estão convencidos de que, mesmo antes do negócio, empresas que já gravitavam em torno de Magro usavam a refinaria de Manguinhos como plataforma das ações de sonegação.
Em 2010, sempre por coincidência, Marcelo Sereno assumiu a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Petróleo de Maricá, município da Região dos Lagos, no Rio. Sua missão era administrar os R$ 20 milhões de royalties que Maricá passaria a receber por mês, pela extração do pré-sal no campo de Tupi, na Bacia de Santos.
Em nota oficial sobre a posse de Sereno, disse em mau português o prefeito de Maricá, Washington Quaquá, que hoje é presidente regional do PT: “A expectativa é que o volume de recursos provenientes da exploração de petróleo possa ser ampliado, passando dos R$ 36 milhões atuais para R$ 240 milhões por ano e que Marcelo Sereno está pronto para assumir mais esse desafio e contribuir, trabalhando, pensando e executando para o desenvolvimento amplo de Maricá”.
É justamente essa quadrilha que conseguiu agora penhorar o edifício-sede da Petrobras, mostrando que o Brasil está de cabeça para baixo e por aqui o crime realmente compensa.
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