domingo, 28 de dezembro de 2014

E se Machado de Assis escrevesse sobre a Petrobras hoje?

Talvez, em vez de sair à procura de cidadãos loucos, ele se voltaria para os corruptos
Uma escritora brasileira me pergunta: “Se Machado de Assis escrevesse agora sua famosa novela O Alienista, que tema de fundo escolheria?”.
Dando uma olhada nas manchetes dos jornais sobre a minha mesa de trabalho, sou levado a pensar que o gênio machadiano teria centrado sua obra hoje não tanto na loucura em contraposição à prudência, e sim na corrupção frente à ética.

O personagem central da primeira obra de realismo literário de Machado de Assis é o médico alienista (psiquiatra) Simão Bacamarte. Repleto de conhecimentos médicos adquiridos nas universidades europeias, decide voltar à sua pequena cidade de Itaguaí, na então província do Rio de Janeiro, para colocar em prática o seu saber psiquiátrico. Quem seria hoje o personagem central da obra?

E os outros personagens variados, do barbeiro ao padre e à própria mulher do alienista – seriam eles hoje os mesmos que foram em O Alienista?




Talvez, em vez de sair à procura de cidadãos loucos para internar na Casa Verde, um manicômio mandado construir por ele, Bacamarte iria hoje atrás de corruptos e corruptores, de juízes, policiais e advogados dispostos a ajudá-lo em seu afã de distinguir aproveitadores de honestos.

O gênio de Machado, o Cervantes brasileiro, fundador da Academia Brasileira de Letras, teria encontrado para seu Alienista personagens tão ou mais interessantes do que aqueles de mais de cem anos atrás, quando escreveu sua obra tragicômica, cheia de humor ácido, bisturi da realidade social de então, povoada como hoje por interesses pessoais e maracutaias políticas.

Machado poderia se divertir amargamente com toda essa caravana de personagens que tingem as atuais notícias a respeito do maior escândalo de corrupção político-empresarial na história deste país.

Entre eles há de tudo: delatores e acobertadores, corruptos e corruptores, vítimas e verdugos; empresários e políticos, assim como um submundo de personagens à sombra, manipulados como bonecos por quem nunca vem à luz. Eles teriam inspirado o realismo e a comicidade de Machado, em quem Alcides Maia dizia ver o humor típico dos escritores britânicos, mas com um verniz tropical.

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